Pesquisa do IOC estuda a especiação de vetores da leishmaniose visceral

Com abordagem pioneira, uma pesquisa do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) trouxe a mais recente resposta para a pergunta de se o Lutzomyia longipalpis, principal vetor da Leishmania chagasi, agente etiológico causador da leishmaniose visceral americana no Brasil, constitui uma única espécie ou não. A pesquisa, iniciada há seis anos, agregou à análise do som que os machos produzem durante a cópula a observação do comportamento desses vetores e a utilização de marcadores moleculares, evidenciando a existência de pelo menos quatro espécies diferentes no país.

Gutemberg Brito
Pesquisadores do Laboratório de Biologia Molecular de Insetos trabalham nas diversas etapas para a detecção de
marcadores moleculares do L. longipalpis

A discussão teve início no final da década de 60, quando foi levantada a possibilidade do L. longipalpis não constituir apenas uma espécie, mas um complexo de espécies. Naquela época, uma pequena diferença morfológica entre os machos – alguns apresentavam uma pinta e, outros, duas pintas no abdômen – chamou a atenção dos pesquisadores.

“Havia uma controvérsia sobre o assunto. Com o estudo do comportamento e a utilização dos marcadores moleculares, mostramos que L. longipalpis é um complexo de várias espécies no Brasil que chamamos de crípticas, ou seja, suas diferenças não são morfológicas e só podem ser detectadas em sua estrutura molecular ou por suas características comportamentais. E stes resultados estão de acordo com a análise de feromônios produzidos pelos machos que tem sido realizada por pesquisadores ingleses e pelo pesquisador Reginaldo Brazil, do Laboratório de Bioquímica, Fisiologia e Imunologia de Insetos do IOC, que também tem colaborado com nosso grupo”, explica Alexandre Peixoto, chefe do Laboratório de Biologia Molecular de Insetos do IOC, onde o estudo é desenvolvido em parceria com a pesquisadora Nataly de Souza, do Laboratório de Transmissores de Leishmaniose, também do IOC.

Gutemberg Brito
Para a extração do material genético
são realizadas várias etapas de centrifugação

Foram analisadas populações de vetores dos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Bahia e de outras regiões do Brasil. As diferenças encontradas entre as espécies foram significativas. “Depois de verificar que estes vetores produziam sinais acústicos durante a cópula, percebemos que os machos de diferentes populações não podem ser da mesma espécie, pois os sons são completamente diferentes”, comenta Alexandre, que já havia utilizado esta metodologia em pesquisas que envolveram Drosophila, gênero de pequenas moscas de frutas. “Utilizamos os genes que haviam sido identificados em Drosophila, que são conhecidos por controlarem o som, como marcadores moleculares para fazermos um estudo de genética de populações nesses vetores”, esclarece.

Gutemberg Brito
O pesquisador Alexandre Peixoto capta o som de corte
dos insetos através de um equipamento desenvolvido
especialmente para a tarefa

Outro importante aspecto investigado pela pesquisa foi o cruzamento das diferentes espécies definidas durante o trabalho. “Estamos fazendo o cruzamento dessas populações e temos encontrado forte isolamento reprodutivo entre elas, confirmando que são de fato espécies diferentes”, Nataly sintetiza. Entre os próximos passos da pesquisa estão a definição de quantas são e qual a distribuição destas espécies no Brasil, qual o grau de isolamento reprodutivo e qual volume de troca de material genético ocorre entre as diferentes espécies. O objetivo é mapear boa parte do país e, mais tarde, a América Latina. Para Alexandre e Nataly, a pesquisa contribuirá para um melhor entendimento deste complexo e de qual a participação efetiva de cada uma dessas espécies na transmissão da LVA, contribuindo, no futuro, para melhores estratégias de controle desses vetores.

Renata Fontoura
10/08/2006


 

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