Estudo sobre o uso do tempo por profissionais
de enfermagem recebe prêmio da CNPq

Quais as conseqüências do trabalho por 12 horas seguidas, de regimes de plantão noturno e do acúmulo de empregos para a saúde do trabalhador? Como profissionais submetidos a essas condições de trabalho reagem e que estratégias utilizam para organizar seu tempo? Com o objetivo de responder a essas perguntas e de produzir dados que subsidiem a discussão sobre a gestão do tempo dispendido no trabalho, um estudo que relaciona gênero, saúde e trabalho desenvolvido pelo Laboratório de Educação em Ambiente e Saúde do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) acaba de receber o 2º Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero. Concedido pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelos ministérios da Ciência e Tecnologia e da Educação e pelo Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher, o prêmio visa estimular e fortalecer a pesquisa sobre as relações de gênero e sensibilizar a sociedade para estas questões.

O estudo é fruto de uma parceria entre o Laboratório do IOC e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e faz parte da monografia de graduação em psicologia de  Flaviany Ribeiro da Silvada, formanda pela UERJ e bolsista de iniciação científica do IOC. Flaviany é orientada pelas pesquisadoras Anna Paula Uziel, da UERJ, e Lúcia Rotenberg, que coordenou a equipe do Laboratório de Educação em Ambiente e Saúde do IOC.

Gutemberg Brito
Flaviany recebeu o prêmio ontem, em Brasília

O estudo A quem pertence o tempo da mulher? Reflexões sobre o cotidiano de profissionais de enfermagem que trabalham à noite em um hospital público no Rio de Janeiro refere-se ao uso do tempo por mulheres e propõe uma reflexão sobre a dinâmica de trabalho e a saúde. “O estudo faz parte de um projeto amplo que enfoca profissionais de hospitais públicos do Estado do Rio de Janeiro com o objetivo de pesquisar as relações entre o trabalho e a saúde humana, com ênfase nos horários de trabalho. O artigo premiado apresenta uma análise qualitativa do uso do tempo por 12 enfermeiras e técnicas de enfermagem de um desses hospitais e foi produzido a partir de entrevistas que buscaram explorar o cotidiano das trabalhadoras e fazê-las refletir sobre a rotina dentro e fora do hospital”, apresenta Flaviany.

A autora destaca que alguns aspectos se repetiram nas entrevistas, principalmente a escassez de tempo. “Muitas profissionais afirmaram precisar de mais de 24 horas para executar as tarefas diárias e conciliar dois ou mais empregos, cuidados com a casa e a família e atividades de lazer. Outro ponto de convergência é a falta de sincronia em relação à família e ao resto da sociedade, já que profissionais de enfermagem obedecem a um regime de horários diverso a outras profissões e geralmente acumulam mais de um emprego”, Flaviany descreve. “Para driblar esse desajuste elas lançam mão de estratégias alternativas, como a troca de plantões, a compra de folgas e a escolha do plantão noturno, que apesar de ser reconhecidamente mais cansativo permite o acompanhamento do cotidiano diurno da família”, completa.

“Utilizamos aportes de várias disciplinas, como a cronobiologia, a antropologia, a psicologia e a epidemiologia para compreender as relações entre o tempo de trabalho e a saúde nesse conjunto de profissionais que tem a vida organizada por horários muito diferentes do restante da sociedade. É preciso refletir sobre essa questão, que tem conseqüências diretas sobre a saúde do trabalhador. O prêmio atribuído ao estudo é um reconhecimento da perspectiva que temos adotado de que o tempo pode e deve ser visto como um objeto de estudo”, Lúcia avalia.

A antropóloga Renata Elisa da Silveira Soares, colaboradora do estudo, concorda: “Esse trabalho trata com muita sensibilidade uma questão que perpassa a vida de todos nós: o tempo. As pessoas que foram entrevistadas vivenciam uma condição diversa à maioria da sociedade, por trabalharem a noite, e acabaram expondo questões comuns a todos nós sobre o gerenciamento do tempo e da vida. É uma contribuição muito relevante para o mundo do trabalho”, conclui.

A cerimônia de premiação aconteceu na última terça-feira, 5 de dezembro, em Brasília, e contou com a presença dos ministros da Educação, Fernado Hadad, e da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, além de Nilcéa Freire, ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, e Ana Falú, diretora do Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Mulher no Brasil.

Bel Levy
08/11/06