Programas de pós-graduação do IOC concorrem em premiação inédita da Capes

Os quatro programas de pós-graduação do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) estão concorrendo na primeira edição do Prêmio Capes de Tese e do Grande Prêmio Capes de Tese. Com o objetivo de destacar as melhores teses de doutorado do país, a premiação, que oferece bolsas de pós-doutorado aos vencedores, foi criada para comemorar o 55º aniversário da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior do Ministério da Educação (Capes/MEC) e será realizada anualmente. Pelo IOC concorrem quatro teses, uma de cada programa de pós-graduação. Os premiados serão indicados no dia 12 de julho, data de aniversário da Capes.

Identificada a mútua exclusão entre diabetes e doenças alérgicas

A tese que representa o programa de pós-graduação em Biologia Celular e Molecular teve como objetivo principal entender melhor as observações de que pacientes diabéticos apresentam menor incidência a doenças alérgicas, mesmo mostrando-se mais suscetíveis a infecções causadas por fungos, vírus e bactérias. “Realizamos ensaios utilizando o modelo de diabetes experimental em ratos Wistar ”, explica Emiliano Barreto, autor da tese Estudo do mecanismo determinante da hiporreatividade mastocitária na diabetes experimental por aloxana em ratos.

Análise comparativa da população de mastócitos em ratos não-diabéticos (esq) e diabéticos (dir).

A pesquisa constatou que ratos diabéticos são menos reativos ao estímulo alergênico em função do comprometimento da população de mastócitos. “Os mastócitos são células cruciais para o disparo e manutenção da resposta inflamatória alérgica”, avalia. “Os ratos apresentaram uma clara redução da reatividade na condição diabética.” Para Emiliano, a indicação ao prêmio foi motivo de comemoração. “A participação neste prêmio marca inúmeras conquistas pessoais e profissionais, que só puderam ser atingidas com o envolvimento de diversas pessoas”, destaca, ressaltando a importância do trabalho da orientadora Patrícia Machado e Silva e do suporte recebido no Laboratório de Inflamação do IOC, onde desenvolve o projeto de pesquisa.

Estudo sobre doença de Chagas aponta alvos terapêuticos

A tese Migração das células inflamatórias para o tecido cardíaco durante a fase aguda precoce da infecção experimental pelo Trypanossoma cruzi: alvos terapêuticos , da doutoranda Ana Paula Marino, representará o programa de pós-graduação em Biologia Parasitária no Prêmio Capes. O estudo, orientado pela pesquisadora Joseli Lannes, do Laboratório de Pesquisas em Auto-imunidade e Imuno-regulação do IOC, investigou a ocorrência de miocardite associada à infecção chagásica. A miocardite – inflamação do músculo cardíaco – atinge de 20 a 30% dos pacientes na fase crônica da infecção e é a principal causa de óbito da doença.

Tecido cardíaco de camundongo infectado na fase aguda (esq) e na fase crônica (dir) da doença de Chagas

O estudo detectou em modelos experimentais na fase aguda da doença de Chagas o predomínio de células CD8 e a presença de moléculas como VCAM-1 e ICAM-1, expressas pelo endotélio dos vasos sanguíneos do coração dos animais infectados, que têm importante papel para a entrada de células durante a infecção no tecido cardíaco. “Além disso, detectamos algumas moléculas quimiotáticas, que participam da atração seletiva das células, e que justificariam o predomínio das células CD8 no tecido cardíaco”, Ana Paula explica. “No próprio tecido cardíaco havia o aumento da expressão dessas moléculas e de células inflamatórias, que expressam o receptor que as reconhece. Se conseguirmos bloquear estes receptores, poderemos amenizar a inflamação”, completa, indicando uma possível estratégia terapêutica.

A pesquisa indicou o bloqueio da migração mediada por receptores de quimiocinas, no caso, CCR1/CCR5, como alvo terapêutico. Além disso, apontou a utilização de met-RANTES, antagonista parcial de RANTES, como potencial imunomodulador para a miocardite chagásica –utilizado experimentalmente na modulação da inflamação em modelos de artrite e alergia, reduzindo a inflamação. “Conseguimos modular a inflamação em 60% sem agravar o parasitismo, além disso o tratamento reduziu uma população específica no quadro inflamatório, que são as células produtoras de IL- 4” , a pesquisadora comemora, ressaltando a importância do resultado na busca de novos tratamentos para a doença. “São alvos interessantes para serem estudados, mas, de qualquer forma, já desponta uma nova oportunidade de tratamento para a miocardite na doença de Chagas”, conclui.

Ana Paula recebeu com surpresa a indicação para o prêmio. “Trabalhamos muito no laboratório e esta indicação é o reconhecimento do nosso trabalho pelo Instituto. Já me sinto premiada”, diz.

Tese analisa epidemiologia da malária em região amazônica

O estudo Aspectos Epidemiológicos da Malária no Parque Nacional do Jaú, Amazonas, Brasil analisou, entre novembro de 2002 e julho de 2003, 540 indivíduos das 14 comunidades que habitam os dois rios do Parque Nacional do Jaú (PNJ), localizado a 220 km de Manaus. A tese representa o programa de pós-graduação em Medicina Tropical do IOC no Prêmio Capes.

O estudo obteve resultados quanto à endemicidade da área, prevalência e fatores associados à infecção, apresentação clínica, resposta humoral da população às diferentes espécies do parasito do gênero Plasmodium – agente etiológico causador da malária –, além de dados entomológicos da região.

A pesquisa indicou uma heterogeneidade da distribuição da malária a despeito da proximidade entre áreas do PNJ, intensificação de sua ocorrência nos últimos anos, transmissão intradomiciliar e alta prevalência de infecção em períodos fora do pico de transmissão. “Evidenciamos que a infecção por plasmódio é tão prevalente quanto em outras áreas malarígenas da Amazônia estudadas durante o pico de transmissão”, avalia Simone Andrade , autora da tese orientada por José Rodrigues Coura , do Laboratório de Doenças Parasitárias do IOC, e Marcelo Urbano Ferreira, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo.

A apresentação clínica da infecção foi outro aspecto importante analisado no estudo. “Entre os infectados houve 60,8% de assintomáticos, alguns, inclusive, com microscopia convencional positiva, o que atenta para a importância da realização do exame em todos os indivíduos de uma área sob busca ativa e não somente entre aqueles que apresentarem sintomas”, a pesquisadora resume, referindo-se à rotina de ação de técnicos da Secretaria de Vigilância em Saúde no controle da endemia. Uma avaliação longitudinal evidenciou a necessidade de acompanhamento prolongado de infectados assintomáticos antes de defini-los como tal, além de ausência de infecção e infecção assintomática como prováveis conseqüências de certo grau de imunidade adquirida pela população, ainda que não seja a área hiperendêmica, nem de transmissão contínua da malária, temas atualmente sob intensa discussão no meio acadêmico.

Quanto à avaliação entomológica, foi constatado que o Anopheles darlingi é o principal vetor da malária no Parque Nacional do Jaú, com predomínio intradomiciliar, pouso nas redes e picos de atividades entre 18h e 23h, o que pode ajudar a orientar ações antivetorias no controle da endemia.

Para Simone, concorrer ao prêmio ultrapassa o reconhecimento. “Independentemente do resultado, esta indicação significa ter respondido à confiança em mim depositada pelos financiadores CAPES, PAPES e CNPq, pelos colaboradores da Fiocruz, ICB da USP, SUCEN-SP, IMT-SP, UFMG-MG e SVS-Brasília, e, sobretudo, pela população do Parque Nacional do Jaú”, finaliza.

Estudo investiga lacuna entre teoria e prática no ensino em biossegurança

O programa de pós-graduação em Ensino em Biociências e Saúde será representado pela tese Construção do conhecimento em saúde: O ensino de biossegurança em cursos de nível médio na Fundação Oswaldo Cruz . O autor, Marco Antônio Ferreira da Costa, desenvolve desde 1992 atividades na área de biossegurança na Fiocruz e desde 1997 na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV). “O trabalho é um produto da nossa vivência na Escola e foi desenvolvido com o objetivo de estudar as características pedagógicas do ensino de biossegurança, explorando o perfil dos docentes, as metodologias aplicadas, o formato das avaliações e a percepção dos alunos sobre o conteúdo lecionado”, Marco Antônio explica.

Os resultados foram importantes para ressaltar a relevância do tema e apontaram um aspecto importante a ser trabalhado, que diz respeito ao impacto do aluno sobre o que aprendeu na escola e o que poderá desenvolver de fato durante sua vida profissional. “É o que chamamos de dissonância cognitiva. O aluno não é incentivado e, por uma série de interferências, acaba não aplicando nos laboratórios o que aprende sobre biossegurança na escola”, o pesquisador conclui.

Outra constatação é que os próprios alunos consideram essencial o ensino de biossegurança no nível fundamental. “Geralmente, o ensino de biossegurança acontece somente na graduação. Durante o trabalho, nos certificamos de que ele deve ser iniciado no nível fundamental, para formação de uma cultura no contexto da biossegurança”, sintetiza.

Um dos capítulos da tese, orientada por Maria de Fátima Barrozo da Costa (Ensp) e Sidnei Quezada Meireles Leite (Cefet-Quimica), deu origem ao livro Entendendo a Biossegurança – Epistemologia e Competências para Área de Saúde, que será utilizado como apoio didático em sala de aula e doado para escolas técnicas do Sistema Único de Saúde (SUS), cursos de saúde do Centro de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET), bibliotecas e universidades.

Marco Antônio considera que a indicação ao prêmio respalda a importância do estudo. “Nossa escola é única da Rede de Escolas Técnicas do SUS, que possui um grupo de estudos em biossegurança. Esta tese foi um marco, pois a própria EPSJV pode servir como norteadora do tema nas demais escolas”, comemora.

 

Renata Fontoura
14/06/06


 

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