Só as nações fortes podem fazer ciência?

Renato Cordeiro
Chefe de Departamento de Fisiologia e Farmacodinâmica do Instituto Oswaldo Cruz,
membro titular da Academia Brasileira de Ciências

“Meditai se só as nações fortes podem fazer ciência ou se é a ciência que as torna fortes.” O provocador convite emana de um dos mais brilhantes cientistas brasileiros, Walter Oswaldo Cruz, do Instituto Oswaldo Cruz. Falecido em 1967, o pesquisador possuía exata noção do peso dos investimentos em ciência e tecnologia (C&T) na construção dos poderes econômicos sustentáveis.

Freqüente indicador do processo de inovação, o número de patentes mundiais depositadas e/ou concedidas anualmente revela os países com maior efervescência inovadora. Segundo a Organização Mundial da Propriedade Intelectual, em 2005 foram depositadas no planeta cerca de 134 mil patentes através do Tratado de Cooperação de Patentes. Lideram o processo os Estados Unidos, com 45,1 mil patentes. Em seguida, apresentam-se o Japão (25,1 mil), a Alemanha (15,8 mil), a França (5,5 mil), a Inglaterra (5,1mil), a Coréia (4,7 mil), a Holanda (4,4 mil) e a Suíça (2,7 mil). A China, um dos grandes destaques na última reunião de Davos, com crescimento econômico anual de 9,9%, alcança a expressiva marca de 2,4 mil patentes, superando dois gigantes do G7-Canadá e Itália, ambos com 2,3 mil patentes, e também a Austrália, com 2 mil patentes.

Álvaro Funcia
Favela da Mandela, Rio de Janeiro

Embora o Brasil figure com modestas 283 patentes, estamos na frente de Portugal (57) e dos principais países parceiros do Mercosul e da América Latina: México (136), Colômbia (27), Argentina (22), Cuba (14), Chile (13), Venezuela (5), e Uruguai (4). Bolívia, Paraguai e Peru não demonstram depósitos em 2005.
Indicadores de produtividade científica atestam a qualidade da pesquisa brasileira. Em 2005, segundo o ISI (EUA), publicamos 16.950 artigos, que representam 1,8% do total mundial. Além disso, destaca-se a formação de 10.616 mil doutores em 2005 ­ parte de um esforço apoiado pela Capes/MEC.

Vivemos um momento de amadurecimento e inflexão para a C&T brasileira. As estratégicas Conferências de C&T e Inovação (também na área da saúde) e a recém-aprovada Lei da Inovação ajudam a criar um ambiente estimulante para que as empresas aumentem seus investimentos em desenvolvimento tecnológico e inovação com universidades e institutos de investigação.

É fundamental que o complexo industrial brasileiro, em especial a indústria farmacêutica (nacional e multinacional), adote os exemplos de empresas de outros países, implementando uma política agressiva de apoio ao desenvolvimento tecnológico e inovação no Brasil. Um exemplo de ousadia a ser seguido é o da Votorantim Ventures, que administra um fundo de investimento de capital de risco de US$ 300 milhões prioritariamente voltado para tecnologia da informação, comunicações e ciências da vida. Outros exemplos exitosos, como os da Embrapa, da Fiocruz, da Embraer, da Petrobras, da Telebrás e da Unicamp, devem ser estimulados continuamente. Para uma mudança cultural, é mister a absorção de doutores pelas instituições de pesquisa e universidades e pelas empresas.

Embora as condições de financiamento à pesquisa tenham melhorado muito no Brasil nos últimos anos, com o advento dos Fundos Setoriais, com um CNPq criativo e eficiente, Fundações de Apoio à Pesquisa nos estados (Fapesp, Faperj etc.), os investimentos brasileiros em ciência e tecnologia, ou seja, 1,37% do PIB em 2005, têm de ser ampliados consideravelmente, sem reservas de contingenciamento, como ocorre atualmente com os 400 milhões do FNDCT.

Projeções de 2003, da OECD, indicam que os Estados Unidos investiram US$ 285 bilhões em pesquisa e desenvolvimento, a União Européia, US$ 211 bilhões, o Japão, US$ 114 bilhões, e a China, US$ 85 bilhões, deixando claro que integrar pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação torna estas nações cada vez mais poderosas. Não há outro caminho a ser percorrido pelo Brasil para se tornar uma grande potência.

Para uma trajetória vitoriosa, grande parcela de responsabilidade cabe ao Congresso Nacional na aprovação do orçamento de C&T de 2006 e na ampliação cada vez maior dos recursos destinados à C&T. Esperamos dos srs. deputados e senadores uma atitude de parceria com a comunidade científica, com os órgãos de fomento do governo federal e as empresas, para que o país possa dar um salto exponencial no seu desenvolvimento, ocupando lugar de destaque na comunidade internacional. Assim construiremos uma nação forte através da ciência, com justiça social e melhores condições de vida para a população brasileira.

 

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