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José CarvalhoJosé carvalho

Foram mais de 60 anos dedicados ao IOC. De 1950 a 1970, José de Carvalho Filho foi o fotógrafo oficial do Instituto. Foi o único a registrar a inauguração do Pavilhão Rocha Lima pelo então presidente Castelo Branco e a gravar para a posteridade em uma fotografia os dez pesquisadores cassados por decreto do governo militar, em 1970, no histórico episódio do Massacre de Manguinhos. Nos anos 80, como fotógrafo de microscopia, Carvalho participou da equipe que identificou os vírus da dengue no Brasil. Atuou até seu falecimento, em 2015, como técnico na equipe que restaura o acervo das Coleções de Patologia e de Febre Amarela do Instituto.

“Meu pai, José de Carvalho, trabalhava na Helmintologia do Instituto Oswaldo Cruz, morávamos na redondeza. O campus era lugar de brincar. Eu e meu irmão gostávamos de ficar correndo no aquário, que ficava atrás do Pavilhão da Peste, onde hoje fica a COC. Quando completei 13 anos, passei em quarto lugar no concurso para trabalhar na Fábrica de Máscaras do Exército, que ficava na entrada da Ilha do Governador. Nossa família era humilde e meu pai ficou preocupado pelo fato de eu, ainda um menino, me deslocar até lá e também em função dos gastos que incluíam a condução e a alimentação. Em 1950, por intermédio dele, consegui um emprego na Seção de Envasamento e Distribuição da Vacina Tífica do IOC, admitido no dia 06 de março, sob a direção de Olympio da Fonseca. Em 1951, fui transferido para a seção de fotografia, localizada no sótão do Castelo e onde fiz o curso de Fotomicrografia do Instituto, ministrado pelo Dr. Nin Ferreira. Inicialmente, fazia serviço de servente, limpava o ambiente. Em determinado momento, o funcionário que lá trabalhava se afastou por motivo de doença e eu assumi seu lugar, ficando sozinho para atender as oito divisões do IOC e o Hospital Evandro Chagas.

Como fotógrafo do Instituto, uma das experiências mais marcantes foi a viagem a Roraima pelo projeto Rondon 1, onde convivemos com Yanomamis no alto Catrimani. Também fui o único fotógrafo autorizado a registrar a inauguração, pelo então presidente da república Humberto de Alencar Castelo Branco, do Pavilhão Rocha Lima do IOC. Além disso, registrei em uma foto a pose dos dez cassados no Massacre de Manguinhos. Na imagem, os pesquisadores Augusto Perissé, Tito Cavalcanti, Haity Moussatché, Fernando Ubatuba, Moacyr Andrade, Hugo de Souza Lopes, Masao Goto, Herman Lent, Sebastião de Oliveira e Domingos Machado. Tive a honra de trabalhar com todos eles, além de Rocha Lagoa – diretor do IOC no período –, Estácio Monteiro, Alexandre Alencar, Margarino Torres, Souza Araújo, Sotero Cabral, Gelly Pereira, Julio Muniz, Octávio Magalhães, Herinque Penna, Costa Lima e José Guilherme Lacorte, dentre outros.

No final da década de 70, fui convidado pelo Dr. José Guilherme Lacorte para chefiar a equipe que trabalhava na seção de audiovisual da ENSP. Fiquei lá até 1977, quando foi oferecido aos servidores um plano de aposentadoria que garantia o salário proporcional. Aceitei e me tornei aposentado pelo IOC. Como moro até hoje em Manguinhos, sempre visitava o campus, gostava de passear por aqui. Em um desses passeios, Dr. Hermann Schatzmayr me encontrou e perguntou se gostaria de voltar ao IOC. Passei a ser bolsista, trabalhando como fotógrafo de microscopia com a Dra. Monika Barth, pesquisadora do IOC e esposa de Dr. Hermann. Me lembro com orgulho que trabalhei com a equipe na primeira vez em que o vírus da dengue 1 foi isolado no Brasil. Trabalhei também a identificação no microscópio dos tipos 2 e 3 do vírus no país.

Neste período, houve um decreto do então presidente da república, que transformou todos os bolsistas da Fiocruz em funcionários públicos (RJU). Me tornei novamente um funcionário do IOC. Depois de um certo tempo, passei por problemas de saúde e fui aposentado novamente. Fiquei cerca de seis anos sem trabalhar, mas sempre vinha ao campus passear. Novamente, em um desses passeios, recebi o convite para fazer parte do projeto de restauração do acervo do Museu de Patologia do IOC, que reúne 500 mil amostras de fígado coletadas durante campanhas para controle da febre amarela no país, desde 1903. Fiz parte da equipe que trabalhou no resgate de mais de 90 mil lâminas com cortes histológicos da Coleção de Febre Amarela, todas já digitalizadas. Atualmente, desenvolvo o mesmo trabalho nas lâminas da Coleção da Histopatologia. Para mim, como um apaixonado pelo IOC, rever este material é uma sensação muito boa.

Se pudesse fazer um pedido, pediria que todos os pesquisadores com que trabalhei durante minha trajetória estivessem vivos. Mas tenho certeza de que minha história no IOC pode servir para que as futuras gerações entendam que é preciso muito amor para dedicar mais de seis décadas ao Instituto”.


 

 

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