A
desconstrução da mídia
Ao
se voltarem para a análise dos significados presentes em
jornais, antropólogos como Edísio Farias, da UFPB,
revelam em Olinda como a imprensa ajuda a reforçar a imagem
revestida de naturalidade dos homicídios
Eduardo
Geraque escreve de Olinda para a ‘Agência Fapesp’:
A foto
chapada de alguém que acaba de ser morto em uma rua qualquer
de uma cidade brasileira, ao mesmo tempo em que choca, ajuda a impulsionar
certas imagens destorcidas da sociedade, que acabam entrando cada
vez mais no chamado imaginário coletivo. Além, claro,
de chamar a atenção do público.
‘O
que ocorre com essas fotos é que elas acabam tornando, entre
outras coisas, o crime algo banal, natural’, disse à
‘Agência Fapesp’ o cientista social Edísio
de Farias Junior, pesquisador da Universidade Federal da Paraíba,
durante a Reunião Anual de Antropologia, em Olinda.
Na
análise feita por ele durante dois anos das fotografias da
editoria de polícia de um jornal popular da cidade do Recife,
o Diário de Pernambuco, várias outras conclusões
puderam ser obtidas.
O que
se observa, segundo o cientista social paraibano, é que aquela
fotografia, quase sempre instantânea, muito por causa dos
prazos exigidos na indústria jornalística moderna,
acaba ficando descontextualizada.
‘Tudo
parece uma repetição. Não existe nada revelado
pela fotografia exatamente além daquilo do que está
sendo visto na imagem’, acredita.
Do
total de chapas catalogadas por Farias Junior, quase 70% mostravam
a imagem de crimes que ocorreram em favelas ou em locais pobres.
Cerca de 95% eram de homens. ‘Mais de 66% eram de menores
de 29 anos de idade’, disse o sociólogo que está
desenvolvendo agora um estudo sobre jovens homicidas.
Se
o cenário trazido pelo pesquisador da Paraíba é
o Recife, outros trabalhos apresentados em Olinda mostraram realidades
semelhantes, mas em outras regiões do Brasil.
No
caso do estudo de Yuri Costa, da Universidade Federal do Maranhão,
os textos publicados na imprensa local sobre crimes também
causaram conseqüências sociais. ‘O discurso midiático
sobre o crime implica na naturalização da violência
não-estatal, que pode ser exemplificada pelos casos de linchamento,
por exemplo’, disse.
A imprensa,
ao camuflar ou distorcer determinados fatos, segundo Yuri, acaba
contribuindo para uma certa legitimização da chamada
justiça feita com as próprias mãos.
‘Além
disso, dos mais de 100 casos analisados de linchamento, menos de
cinco terminaram em prisões dos linchadores’, disse.
Esse dado vai levar o pesquisador, agora, a entrar também
no mundo do judiciário, além das análises das
páginas de jornais.
(Agência Fapesp, 15/6)
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