Preenchendo as lacunas

Agência Fapesp

Da revista Pesquisa FAPESP
Em fevereiro de 2001, ao ser apresentado publicamente, o genoma humano foi comparado a uma paisagem com extensos desertos entremeados por esparsas cidades. Os desertos representavam os longos trechos do DNA, tecnicamente chamados de íntrons, que aparentemente não faziam nada - não levavam à produção de proteínas que formam os seres vivos. As cidades seriam os trechos funcionais do DNA, chamados éxons. Mas ainda havia muita neblina e, num primeiro momento, era impossível saber o que era deserto e o que eram as cidades, nem quantas eram, nem onde estavam. Tamanha era a incerteza que as estimativas do número de genes variavam de 35 mil a 120 mil.
Em uma corrida internacional em busca de um número exato, da localização precisa, do tamanho e da estrutura dos genes, grupos de pesquisa dos Estados Unidos, do Japão e da Alemanha lotaram salas com dezenas de seqüenciadores de DNA, que funcionavam dia e noite. Mesmo sem tantos equipamentos, os pesquisadores de universidades e institutos paulistas não se deixaram abater.
Adotaram uma estratégia própria e ambiciosa - com uma análise exaustiva dos dados públicos sobre o genoma aliada a testes de laboratórios - e, quatro anos depois, conseguiram completar a seqüência de 211 genes, dos quais antes só havia fragmentos, além de mostrar onde eles se encontram no genoma - as cidades ganharam uma localização exata no meio da paisagem desértica.
Os quase cem pesquisadores de 31 laboratórios de universidades paulistas e do Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer também descobriram cerca de 40 genes novos, que ainda não haviam sido descritos por nenhum outro grupo. Os resultados desse trabalho, coordenado por Anamaria Camargo, do Ludwig, e por Mari Cleide Sogayar, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP), foram publicados on-line no final do mês passado e saíram no dia 1º deste mês na versão impressa da revista Genome Research.
"Essa é a ciência que resulta de uma parceria entre a FAPESP e o Instituto Ludwig", comenta José Fernando Perez, diretor-científico da FAPESP. A Fundação e a filial paulista do Ludwig conduziram durante dois anos, de 1999 a 2001, o Projeto Genoma Humano do Câncer, para o qual cada instituição destinou o equivalente, hoje, a R$ 30 milhões.
O trabalho conjunto terminou com o saldo de aproximadamente 1,2 milhão de seqüências de genes associados a vários tipos de câncer - eram trechos centrais dos genes, caracterizados por meio de uma metodologia criada no país, a Orestes, sigla de Open Reading Expressed Sequence Tags, que em português significa algo como etiquetas da fase aberta de leitura de seqüências expressas. Em uma abordagem complementar, outros grupos de pesquisa haviam seqüenciado os extremos dos trechos de genes, com outra técnica, a EST, de Expressed Sequence Tags ou etiquetas de seqüências expressas.

20/07/2004