Publicação do Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz - Ano XII - n0 40- 09/11/2006

 

Malária, hepatites, HIV e gripe aviária colocam desafios terapêuticos

A prevenção e o monitoramento do vírus da gripe aviária no Brasil, os avanços terapêuticos no tratamento da malária e a resistência viral em pacientes portadores do vírus HIV, hapatite C e B, estiveram na pauta dos debates no terceiro dia do III Simpósio de Resistência aos Antimicrobianos - I Simpósio de Resistência a Drogas Quimioterápicas , realizado pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC).

Rede monitora a resistência aos antimaláricos na Amazônia

Com a participação de quatro especialistas, a primeira mesa redonda do dia abordou os avanços terapêuticos no tratamento da malária e a resistência dos parasitos às drogas comumente utilizadas no combate à doença – um dos principais problemas enfrentados atualmente em relação ao tema no Brasil e no mundo.

Marinete Povoa, do Instituto Evandro Chagas, em Belém (PA), apresentou a Rede Amazônica de Vigilância da Resistência às Drogas Antimaláricas (RAVREDA). Formada pelos países que compõem a região amazônica – Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela –, a rede conta com a parceria da Organização PanAmericana de Saúde (OPAS) e começou a desenvolver suas atividades em 2001. “O objetivo é promover a vigilância da resistência e possíveis mudanças nas políticas de medicamentos, através da padronização de metodologias e protocolos. O estudo in vitro da resistência plasmodial aos antimaláricos é uma das atividades desenvolvidas”, Marinete explicou. Os pesquisadores Leonardo de Carvalho, do Laboratório de Pesquisa em Malária do IOC, Maria das Graças Alecrim, do Centro Universitário Nilton Lins de Manaus, e Mariano Zalis, do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (UFRJ), também palestraram sobre o tema.

Resistência viral no foco das discussões

A contribuição dos testes de genotipagem e dos estudos moleculares dos vírus da Aids e da hepatite B e C na detecção e controle da resistência a drogas retrovirais e antivirais foi reforçada pelos convidados da segunda mesa redonda do dia. A pesquisadora do IOC Elisabeth Lampe apresentou o tema Genotipagem e resistência do vírus da hepatite C . Segundo a pesquisadora, o elevado número de infectados e a gravidade da doença hepática fazem com que a infecção crônica causada pelo vírus se transforme em um importante problema de saúde pública. “Estima-se que cerca de 2,2 milhões de brasileiros estejam infectados pelo vírus da hepatite C e, por causar uma infecção crônica, os custos do tratamento destes pacientes para a rede pública de saúde são muito altos”, avaliou.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 400 milhões de pessoas no mundo são portadoras crônicas do vírus da hepatite B. O dado foi apresentado pela especialista Selma Gomes , do Laboratório de Virologia Molecular do IOC. A pesquisadora explicou que até o momento foram definidos oito genótipos do vírus. “No Brasil, o genótipo predominante é o AA, com mais de 50% dos casos. O AA é um genótipo africano”, afirmou. Para a pesquisadora, a história do vírus da hepatite B é muito parecida com o do vírus HIV no que diz respeito a drogas para terapia. “A co-infecção com HIV é muito comum e o tratamento se assemelha bastante. Porém, enquanto no HIV a resistência é progressiva, na hepatite B ela aparece de uma só vez”, descreveu.

Pesquisador do Departamento de Genética da UFRJ, Rodrigo Brindeiro deu continuidade às apresentações sobre resistência viral com o tema Resistência natural do HIV no Brasil e novas drogas anti-retrovirais. Segundo o pesquisador, a procura de alternativas terapêuticas para os pacientes vivendo com HIV passa pela definição do subtipo do vírus. “A maior parte das drogas são desenvolvidas a partir do subtipo B, porém o subtipo que tem maior prevalência no mundo é o C”, ressaltou.

Sobre a resistência aos medicamentos, Brindeiro alertou que ela pode ser transmitida junto com o vírus e persistir durante anos. “No Brasil, temos 6% de resistência, sendo 2% para cada classe terapêutica. O tratamento não pode ser monoterápico, mas feito a partir de uma combinação de várias drogas. Este é um dos nossos maiores desafios”, comentou. Entre as soluções apontadas pelo pesquisador está o desenvolvimento de drogas que possam prever as mutações do vírus, responsáveis pela resistência. “É preciso uma ação terapêutica forte. O HIV tem nos ensinado muito. Muitas drogas foram aprovadas em pouco tempo”, concluiu.

José Carlos Fernandez, pesquisador do Laboratório de Aids e Imunologia Molecular do IOC, apresentou a distribuição de subtipos do HIV no país e reforçou a importância da genotipagem para a identificação das mutações e suas conseqüências para o tratamento. “Precisamos estar atentos para identificar a resistência natural e a resistência adquirida aos medicamentos para direcionar o tratamento antirretroviral e identificar a transmissão do vírus resistente”, finalizou.

As novas e antigas drogas utilizadas no tratamento do vírus da gripe (influenza) foram avaliadas na apresentação de Fernando Motta, pesquisador do Laboratório de Vírus Respiratório e Sarampo do IOC. Fernando encerrou a mesa redonda enfatizando que a variabilidade genética do vírus influenza é a grande dificuldade a ser enfrentada. “A vacina para o vírus da gripe precisa ser tomada todos os anos em função da diversidade genética que faz com que ele se transforme de um ano para o outro”, afirmou. “Esta mesma dificuldade se apresenta no dia-a-dia do laboratório, onde as possibilidades terapêuticas são testadas contra as cepas mais recentes”, finalizou.

A prevenção e monitoramento da gripe aviária em pauta

As ações de prevenção contra a entrada do vírus da gripe aviária (H5N1) no Brasil foram a pauta principal da mesa redonda que encerrou as atividades do terceiro dia de evento. Representante da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro (PESAGRO-RIO), Maíra Liberal apresentou medidas de prevenção que estão sendo realizadas no Estado, como a capacitação de profissionais e a mobilização das autoridades. Já as estratégias da rede laboratorial foram apresentadas por Lúcia Maia, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). “Instituímos uma rede de Laboratórios Nacionais Agropecuários (LANAGROS), que hoje conta com seis unidades e controla a qualidade de vacinas e diagnostica doenças aviárias”, descreveu.

Ariel Mendes, representante da União Brasileira de Avicultura, ressaltou a importância econômica da produção avícola brasileira. “O Brasil é o segundo maior produtor de frangos do mundo e o maior exportador deste tipo de carne, tendo levado o produto a 141 países só em 2005” , destacou. Para Ariel, os números são suficientes para dimensionar a ameaça da entrada do H5N1 no país. “Precisamos de uma barreira sanitária forte para evitar a entrada do vírus. O MAPA já adotou maior rigor na importação de material genético avícola e reativou os incineradores nos aeroportos brasileiros”, avaliou. “A maneira mais prática e rápida de deter a circulação do vírus, caso ele entre no país, é eliminá-lo na fonte, ou seja, nas aves”, finalizou.

Para encerrar a mesa redonda, Marilda Siqueira, chefe do Laboratório de Vírus Respiratório e Sarampo do IOC, que integra a rede de vigilância montada pelo Ministério da Saúde para prevenir a entrada do vírus da gripe aviária no Brasil, expôs as dificuldades no monitoramento da variabilidade do vírus influenza aviário e a cadeia de transmissão ate chegar ao homem. “Nossa equipe trabalha para identificar o perfil evolutivo do vírus. O plano de contingência está apoiado basicamente em um diagnostico rápido e na eliminação dos focos, caso o vírus entre no país”, explicou.


Renata Fontoura

IOC - Ciência para a Saúde da População Brasileira