Publicação do Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz - Ano XIII - n0 05- 29/03/2007

 

Seminário comemora o centenário da descoberta do ciclo exoeritrocítico
da malária pelo brasileiro Henrique Aragão

Cientistas e historiadores estarão reunidos nos dias 12 e 13 de abril para participar do Seminário Henrique Aragão e a pesquisa sobre a malária: 100 anos da descoberta do ciclo exoeritrocítico da malária, realizado em parceria pela Casa de Oswaldo Cruz (COC) e o Instituto Oswaldo Cruz (IOC). A doença, responsável pela morte de um a três milhões de pessoas por ano no mundo, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), é tema do evento que articula a história da ciência às mais recentes descobertas na área, discutindo desafios atuais e perspectivas futuras frente à doença, que registrou 540 mil casos no Brasil em 2006.

Laboratório de Pesquisas em Malária/IOC
Plasmodium falciparum em cultivo no Laboratório de Pesquisas em Malária do IOC

“Vejo no Seminário Henrique Aragão, além de uma homenagem, uma reflexão relativa aos desdobramentos dos conhecimentos gerados no passado sobre o presente e um estímulo para enfrentarmos os vários desafios atuais e futuros sobre a malária no Brasil e no mundo”, resume o tropicalista José Rodrigues Coura, chefe do Departamento de Medicina Tropical do IOC e pesquisador emérito da Fiocruz. Membro da comissão organizadora do evento, Coura apresentará palestra sobre a trajetória do pesquisador Henrique Aragão no primeiro dia de seminário. “O sentido primordial do seminário é articular a visão dos que estão realizando pesquisas sobre o tema e a perspectiva mais ampla, fornecida pela história, a respeito dos processos e contextos que nortearam a produção deste conhecimento ao longo do tempo”, ressalta Magali Romero Sá, pesquisadora da COC e presidente da comissão organizadora, também integrada pelos pesquisadores do IOC Ricardo Lourenço e Claudio Tadeu Daniel Ribeiro.

“Espera-se que a articulação de planejadores de medidas de controle, pesquisadores e historiadores especialistas em malária permite que novos desenhos de experimentos e estratégias de controle sejam traçados, levando em consideração a história da evolução do conhecimento sobre a doença – com seus erros e acertos”, avalia Claudio Ribeiro, chefe do Departamento de Imunologia do IOC e coordenador do Centro de Pesquisas, Diagnóstico e Treinamento em Malária da Fiocruz.

Entre os participantes convidados estão Pierre Druilhe (Institut Pasteur), que debate as relações entre o ciclo exoeritrocítico e a imunidade; e Laurent Renia (Hôpital Cochin) que analisará aspectos do papel biológico do ciclo exoeritrocítico (hepático) do parasita. Randall Packard (Johns Hopkins University) discute as estratégias de controle da doença sob uma perspectiva histórica e Luiz Hildebrando Pereira da Silva (Instituto de Pesquisas em Patologias Tropicais - Ipepatro), debate a influência do ciclo exoeritrocítico do P. vivax no desafio do controle da malária no Brasil.

Acervo COC
Henrique Aragão também foi responsável pelo avanço do conhecimento científico sobre carrapatos. O acervo da Coleção Henrique Aragão está reunida na Coleção Entomológica do IOC.

A descoberta do ciclo exoeritrocítico [exo= fora; eritrócito=hemácia] – fase evolutiva desenvolvida fora das hemácias pelo plasmódio, parasito causador da malária – realizada por Henrique de Beaurepaire Rohan Aragão em 1907 no IOC foi fundamental para a posterior identificação do ciclo hepático da malária humana pelo inglês Percy Cyril Claude Garnham (1901-1994). Junto com o pesquisador do IOC Leônidas Deane, Garnham recebeu a primeira Medalha Henrique Aragão, criada em 1991 por Claudio Ribeiro e Hooman Momen. No último dia do seminário (13 de abril), a professora brasileira Ruth Nussenzweig, da Universidade de Nova York, será a primeira mulher a receber a medalha por sua contribuição mundial ao estudo da imunologia e parasitologia, sobretudo no domínio da malariologia, das mãos de Tania Araújo-Jorge, primeira mulher a dirigir o IOC desde sua criação, em 1900.

A valorização da quebra de paradigmas é uma das marcas do seminário, que apresentará exemplos históricos da importância de superação de certos dogmas científicos. “O próprio Aragão, àquela época diretor do IOC, desestimulou o hoje consagrado pesquisador Lobato Paraense [que participa do seminário no dia 13], a investigar a hipótese de que o parasita, em sua forma infectante, invadisse células não eritrocíticas – o que hoje é comprovado. Aragão sustentava então a hipótese – levantada na época por pesquisador que desenhara o que afirmara ter visto - de que o alvo do parasito na forma infectante (esprozoíta) injetada pelos mosquitos eram os próprios glóbulos vermelhos”, Claudio conta.

Além de palestras, o Seminário contará com mostra de trabalhos científicos de estudantes, exibidos através de pôsteres, e com uma exposição sobre a trajetória de Henrique Aragão. "O objetivo da mostra de pôsteres é estimular discussões acadêmicas sobre a pesquisa em malária no Brasil e propiciar a interação entre os participantes. A mostra contará com trabalhos de estudantes de todo o Brasil – cerca de 60% deles de fora do Rio de Janeiro, de Estados como São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pará, Amazonas, Rondônia, Mato Grosso, Tocantins e Distrito Federal – que versam sobre diferentes aspectos do estudo da malária: história, epidemiologia, clínica, imunologia, fisiopatologia, entomologia, diagnóstico, desenvolvimento de vacinas e busca de alvos terapêuticos", descreve Leonardo Carvalho, pesquisador do Laboratório de Pesquisas em Malária do IOC que organiza a mostra em parceria  com as pesquisadoras Martha Mutis, do Laboratório de Doenças Parasitárias do IOC, e Simone Kropf, da COC.

“Uma iniciativa importante deste seminário é a participação de estudantes de todo o Brasil”, Claudio Ribeiro completa. “Ao entrar em contato com a história da evolução do conhecimento sobre a malária e com cientistas que trouxeram contribuições de impacto para o estudo da doença, eles receberão um estímulo ao inconformismo para quebrar paradigmas e transpor obstáculos deixados por dogmas criados no passado. Isso é fundamental para a evolução do conhecimento: grandes avanços científicos resultam tanto de trabalho árduo e contínuo baseado em idéias e metodologias que se comprovam adequadas para a produção de mais conhecimento naquela área ou tema, mas também decorrem de insights que produzem mudanças na maneira de pensar e permitem a quebra de paradigmas. Dar essa oportunidade aos estudantes, transformando-os em 'vítimas potenciais de insights iluminados e reveladores', é o grande trunfo potencial do seminário”, sintetiza.

"Uma edição especial da revista científica Memórias do Instituto Oswaldo Cruz será dedicada à pesquisa biomédica em malária, com a participação de importantes pesquisadores brasileiros e estrangeiros sobre variadas abordagens de investigação, desde a epidemiologia e vetores da malária até a biologia molecular e genética dos plasmódios e seus transmissores", acrescenta , informa Ricardo Lourenço, editor das Memórias e Vice-Diretor de Ensino, Informação e Cominicação do IOC. Este será o terceiro número do periódico em 2007, a ser lançado em maio.

A ficha de inscrição deve ser enviada para o email seminarioharagao@coc.fiocruz.br. As inscrições também poderão ser realizadas no local. O evento será realizado nos dias 12 e 13 de abril no auditório do Pavilhão Arthur Neiva. Confira a programação completa:

12 abril

9h – Abertura
Paulo Buss, Maria do Carmo Leal , Reinaldo Guimarães, Paulo Gadelha, Nara Azevedo, Tania Araújo-Jorge

9h30 – Palestra
Aragão, Ciclo Exoeritrocítico e desafio da Malária no Brasil
Luiz Hildebrando Pereira da Silva (IPEPATRO)
Presidente – Luis Rey (IOC, Fiocruz)

10h30 – A trajetória de Henrique Aragão
José Rodrigues Coura (IOC, Fiocruz)

13h30 - 16h – MESA REDONDA
Marco Zero: A descoberta do agente causal e do vetor transmissor
Presidente – Ricardo Lourenço de Oliveira (IOC, Fiocruz)
Secretária – Dalma Maria Banic (IOC, Fiocruz)

• Jaime Benchimol (COC, Fiocruz) – Teorias e paradigmas sobre a malária no século XIX e o impacto da teoria dos germes

• Gabriel Gachelin (Université de Paris VII, Rehseis) & Annick Opinel (Institut Pasteur) - A área oeste do Mediterrâneo como laboratório internacional para testar procedimentos antimaláricos, 1920-1930

• Laurent Renia (Hôpital Cochin) A biologia do ciclo pré-eritrocítico da malaria

16h30
Apresentação de pôsteres
Coordenação: Leonardo José de Moura Carvalho ( IOC, Fiocruz)
Marta Cecília Mutis Suarez (IOC, Fiocruz)
Simone Petraglia Kropf (COC, Fiocruz)

13 abril

9h - 12h – MESA-REDONDA

Marco I: Descoberta do ciclo exoeritrocítico da malária e impacto na pesquisa e controle
Presidente – Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro (IOC, Fiocruz)
Secretário – Magali Romero Sá (COC, Fiocruz)

• Wladimir Lobato Paraense – Esquizogonia do halterídio do pombo e sua influência na evolução da protozoologia

• Pierre Druilhe (Institut Pasteur) - O papel e a função biológica do ciclo pré-eritrocítico na imunidade

• Jean François Pays (Faculté de Médecine Necker Enfants Malades) A história da descoberta do ciclo de vida do Plasmodium

• Antoniana Ursine Krettli (CPqRR, Fiocruz) Estudos no modelo da malária aviária

14h -16h30 – MESA-REDONDA
Marco II: História e perspectivas contemporâneas do controle da malária
Presidente – Paulo Gadelha (VPDIGT, Fiocruz)
Secretário – Gilberto Hochman (COC, Fiocruz)

• Randall Packard (Johns Hopkins University) - Entendendo o ressurgimento global da malaria, uma perspective histórica

• Marcos Cueto (Universidade Peruana Cayetano Heredia) – A OMS, a OPAS e o combate à malária na América Latina

• Pedro Luiz Tauil (UnB) – O controle da malária no Brasil: história e perspectivas

17h – Entrega da Medalha Henrique Aragão à professora doutora Ruth Nussenzweig
Cláudio Tadeu Daniel Ribeiro , Mércia Eliane Arruda e Tania Araújo-Jorge.

18h30 – Coquetel

 

 

Bel Levy, Raquel Aguiar e Renata Fontoura


IOC - Ciência para a Saúde da População Brasileira