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A ciência feita por pesquisadores e sociedade

Experiências mostram como a participação popular pode fortalecer a pesquisa e promover equidade em saúde
Por Yuri Neri03/11/2025 - Atualizado em 05/11/2025

‘Ciência cidadã’ é um conceito que vem ganhando força em diferentes áreas do conhecimento ao propor a participação ativa da sociedade na produção de dados e saberes científicos. A prática tem sido debatida e incorporada em iniciativas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e tende a ganhar ainda mais espaço nos próximos anos. 

O último dia (31/10) do 3º Ato do Simpósio IOC Jubileu 125 anos foi dedicado ao tema “Ciência Cidadã: oficinas de conceitos e práticas”, com sessões que compartilharam experiências de sucesso e discutiram caminhos para ampliar a participação social no fazer científico. 

Com transmissão online pelo Canal do IOC no YouTube, a mesa de abertura apresentou o conceito e destacou que, embora sua utilização seja relativamente recente no Brasil, a prática já faz parte da rotina de pesquisas e projetos do Instituto há muitos anos. 

Diretora de Pesquisa, Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do IOC, Luciana Garzoni, ressaltou que a proposta para os próximos anos é ampliar o diálogo entre ciência e sociedade, promovendo ações que valorizem o conhecimento local e contribuam para pesquisas mais aplicadas e transformadoras.  

“É fundamental enxergar o cidadão como pesquisador popular — alguém que troca saberes conosco e ajuda a gerar dados mais fidedignos, reais e aplicáveis à população que estudamos. Esperamos que este encontro sirva como um ponto de partida para ampliar esse movimento dentro do Instituto e consolidar a ciência cidadã como uma prática transversal às nossas pesquisas”, destacou. 

Confira a transmissão na íntegra:

‘Desencastelar’ a Fiocruz 

A primeira sessão do dia, ‘Ciência aberta e cidadã: oportunidades e desafios’ recebeu a pesquisadora do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), Sarita Albagli. A mediação ficou a cargo de Mariana Alberti, doutorandao do Programa de Pós-graduação em Ensino em Biociências e Saúde do IOC. 

A cientista relacionou a ciência cidadã à ciência aberta, abordagem que busca tornar os processos científicos mais transparentes, colaborativos e acessíveis. 

Segundo a pesquisadora, as duas áreas vivem um momento de consolidação, em que avanços institucionais caminham lado a lado com disputas políticas e de sentidos. De um lado, cresce a estruturação de redes, laboratórios e programas dedicados à temática — como o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Ciência Cidadã  e a Rede Brasileira de Ciência Cidadã —; de outro, persistem controvérsias sobre o que significa, na prática, abrir a ciência e reconhecer o papel da população na produção de conhecimento. 

“Estamos em um momento em que esses termos, conceitos e valores estão sendo desafiados”, afirmou.  

“Há disputas de narrativas sobre o que se quer expressar e defender quando falamos em ciência aberta ou cidadã, e também disputas por apropriação,: não apenas sobre como nomeamos essas práticas, mas sobre o que efetivamente fazemos com elas.”, completou Sarita. 

Nesse cenário, a autora destacou que ‘ciência cidadã’ é um termo polissêmico — com múltiplos sentidos e interpretações — e contextual, já que adquire significados, ênfases e efeitos distintos conforme o local, os atores e os protocolos envolvidos. Por isso, defendeu que a institucionalização avance, mas seja guiada pela pergunta ‘que ciência queremos, para quê e para quem?’. 


Participantes das sessões da manhã. Foto: Reprodução/Canal IOC

Em seguida, a coordenadora de Informação e Comunicação da Fiocruz, Vanessa de Arruda Jorge, apresentou um mapeamento inicial sobre ciência cidadã na Fundação, com base em produção científica, projetos cadastrados no Lattes, grupos de pesquisa e iniciativas de fomento. 

Os resultados indicam tendência de crescimento no uso de abordagens participativas, com o IOC em posição de destaque entre os projetos já em andamento ou concluídos. Vanessa também lembrou que a Fiocruz dispõe de políticas e infraestruturas de ciência aberta — como o Arca Dados — e participa da formulação de indicadores nacionais para avaliação de projetos de ciência cidadã. 

Já a diretora de Pesquisa, Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do IOC, Luciana Garzoni, apresentou uma experiência de ciência cidadã desenvolvida na Baixada Fluminense para enfrentar a pandemia de Covid-19 em territórios vulnerabilizados. 

O projeto integrou testagem em domicílio, vigilância genômica e ações educativas, com articulação da Fiocruz, prefeituras e associações locais para garantir acesso rápido ao diagnóstico e à vacinação. 

A iniciativa foi cocriada e conduzida em conjunto com moradores, desde a formulação das perguntas até análise e devolutiva dos resultados. Enfermeiros e técnicos de enfermagem das próprias comunidades foram capacitados para atuar como agentes populares de vigilância, realizando testagem, inquéritos sorológicos e ações educativas. 

A experiência garantiu a testagem de mais de mil moradores e resultou em ações de vacinação articuladas com as prefeituras locais, alcançando áreas dominadas pela violência e de difícil acesso para o poder público. 

Segundo a pesquisadora, o projeto é prova de que a ciência cidadã pode ser instrumento de equidade, reduzindo desigualdades e fortalecendo a capacidade local de resposta em saúde. 

Nas matas e no céu 

À tarde, a programação focou em outras iniciativas de sucesso em ciência cidadã. A pesquisadora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Karine Bueno, apresentou um panorama de ciência participativa desenvolvida em áreas protegidas da Baixada Fluminense, especialmente na Floresta Nacional Mário Xavier, em Seropédica (RJ). 

Ela relatou que foi observado um déficit de educação ambiental no município. A partir dessa constatação, criou em 2018 o programa ‘Guarda Compartilhada Flona Mário Xavier’, voltado à formação de monitores ambientais e à aproximação entre a UFRRJ, as escolas e a unidade de conservação. 

“A área verde na cidade beneficia todo mundo, então todos precisam cuidar e fazer a guarda compartilhada desse ambiente. É preciso haver uma visão de colaboração mútua entre os moradores de Seropédica e esse espaço de uso público.”, disse. 

Segundo Karine, o projeto já envolveu mais de 5 mil estudantes e 100 professores da rede básica, além de centenas de universitários da UFRRJ, que atuam como educadores ambientais. As ações incluem trilhas interpretativas, oficinas, cartilhas, teatro de fantoches e materiais lúdicos produzidos pelos próprios alunos. 

Outros desdobramentos da iniciativa incluem mapeamentos participativos e projetos de fotografia de natureza como ferramenta de divulgação científica. O concurso ‘Baixada Fluminense e Vida que Pulsa’, por exemplo, reuniu mais de 300 imagens enviadas por participantes de diferentes unidades de conservação da região. 

Por fim, o pesquisador do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO), Marcelo Antônio Barros de Cicco, detalhou o projeto ‘EXOSS Citizen Science’, uma rede brasileira de observação e estudo de meteoros baseada em colaboração voluntária entre astrônomos profissionais e amadores. 

Criada em 2015, a iniciativa nasceu com nove entusiastas e doze câmeras e cresceu até se tornar uma rede colaborativa com 81 câmeras em 58 estações distribuídas em todas as regiões do Brasil, reunindo 57 pessoas e 21 instituições. 

“É um projeto genuinamente de ciência cidadã. Ele une o profissional da ciência com o amador que deseja fazer parte de um estudo científico”, definiu. 

A rede monitora bólidos e chuvas de meteoros, determinando órbitas e trajetórias a partir de registros feitos por câmeras instaladas por voluntários, aliando baixo custo à alta motivação dos participantes. 

O pesquisador apresentou imagens de meteoros capturados pelas estações e ressaltou a dimensão educativa da iniciativa, que mantém o site ‘press.exoss.org’ e promove ações de divulgação científica em escolas e museus. 

Entre os resultados do EXOSS, estão colaborações com a NASA, o SETI Institute, o Observatório Nacional e universidades brasileiras. A rede também é responsável por representar no Brasil a ferramenta internacional ‘Relate um Bólido’, que permite ao público enviar relatos e vídeos de meteoros observados no céu. 

“O projeto acaba sendo uma porta de entrada para jovens que minimamente não tinham um interesse forte em ciência e, quando participam, animam-se tanto que acabam seguindo a carreira científica”, finalizou. 

Experiências mostram como a participação popular pode fortalecer a pesquisa e promover equidade em saúde
Por: 
yuri.neri

‘Ciência cidadã’ é um conceito que vem ganhando força em diferentes áreas do conhecimento ao propor a participação ativa da sociedade na produção de dados e saberes científicos. A prática tem sido debatida e incorporada em iniciativas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) e tende a ganhar ainda mais espaço nos próximos anos. 

O último dia (31/10) do 3º Ato do Simpósio IOC Jubileu 125 anos foi dedicado ao tema “Ciência Cidadã: oficinas de conceitos e práticas”, com sessões que compartilharam experiências de sucesso e discutiram caminhos para ampliar a participação social no fazer científico. 

Com transmissão online pelo Canal do IOC no YouTube, a mesa de abertura apresentou o conceito e destacou que, embora sua utilização seja relativamente recente no Brasil, a prática já faz parte da rotina de pesquisas e projetos do Instituto há muitos anos. 

Diretora de Pesquisa, Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do IOC, Luciana Garzoni, ressaltou que a proposta para os próximos anos é ampliar o diálogo entre ciência e sociedade, promovendo ações que valorizem o conhecimento local e contribuam para pesquisas mais aplicadas e transformadoras.  

“É fundamental enxergar o cidadão como pesquisador popular — alguém que troca saberes conosco e ajuda a gerar dados mais fidedignos, reais e aplicáveis à população que estudamos. Esperamos que este encontro sirva como um ponto de partida para ampliar esse movimento dentro do Instituto e consolidar a ciência cidadã como uma prática transversal às nossas pesquisas”, destacou. 

Confira a transmissão na íntegra:

‘Desencastelar’ a Fiocruz 

A primeira sessão do dia, ‘Ciência aberta e cidadã: oportunidades e desafios’ recebeu a pesquisadora do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), Sarita Albagli. A mediação ficou a cargo de Mariana Alberti, doutorandao do Programa de Pós-graduação em Ensino em Biociências e Saúde do IOC. 

A cientista relacionou a ciência cidadã à ciência aberta, abordagem que busca tornar os processos científicos mais transparentes, colaborativos e acessíveis. 

Segundo a pesquisadora, as duas áreas vivem um momento de consolidação, em que avanços institucionais caminham lado a lado com disputas políticas e de sentidos. De um lado, cresce a estruturação de redes, laboratórios e programas dedicados à temática — como o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Ciência Cidadã  e a Rede Brasileira de Ciência Cidadã —; de outro, persistem controvérsias sobre o que significa, na prática, abrir a ciência e reconhecer o papel da população na produção de conhecimento. 

“Estamos em um momento em que esses termos, conceitos e valores estão sendo desafiados”, afirmou.  

“Há disputas de narrativas sobre o que se quer expressar e defender quando falamos em ciência aberta ou cidadã, e também disputas por apropriação,: não apenas sobre como nomeamos essas práticas, mas sobre o que efetivamente fazemos com elas.”, completou Sarita. 

Nesse cenário, a autora destacou que ‘ciência cidadã’ é um termo polissêmico — com múltiplos sentidos e interpretações — e contextual, já que adquire significados, ênfases e efeitos distintos conforme o local, os atores e os protocolos envolvidos. Por isso, defendeu que a institucionalização avance, mas seja guiada pela pergunta ‘que ciência queremos, para quê e para quem?’. 


Participantes das sessões da manhã. Foto: Reprodução/Canal IOC

Em seguida, a coordenadora de Informação e Comunicação da Fiocruz, Vanessa de Arruda Jorge, apresentou um mapeamento inicial sobre ciência cidadã na Fundação, com base em produção científica, projetos cadastrados no Lattes, grupos de pesquisa e iniciativas de fomento. 

Os resultados indicam tendência de crescimento no uso de abordagens participativas, com o IOC em posição de destaque entre os projetos já em andamento ou concluídos. Vanessa também lembrou que a Fiocruz dispõe de políticas e infraestruturas de ciência aberta — como o Arca Dados — e participa da formulação de indicadores nacionais para avaliação de projetos de ciência cidadã. 

Já a diretora de Pesquisa, Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do IOC, Luciana Garzoni, apresentou uma experiência de ciência cidadã desenvolvida na Baixada Fluminense para enfrentar a pandemia de Covid-19 em territórios vulnerabilizados. 

O projeto integrou testagem em domicílio, vigilância genômica e ações educativas, com articulação da Fiocruz, prefeituras e associações locais para garantir acesso rápido ao diagnóstico e à vacinação. 

A iniciativa foi cocriada e conduzida em conjunto com moradores, desde a formulação das perguntas até análise e devolutiva dos resultados. Enfermeiros e técnicos de enfermagem das próprias comunidades foram capacitados para atuar como agentes populares de vigilância, realizando testagem, inquéritos sorológicos e ações educativas. 

A experiência garantiu a testagem de mais de mil moradores e resultou em ações de vacinação articuladas com as prefeituras locais, alcançando áreas dominadas pela violência e de difícil acesso para o poder público. 

Segundo a pesquisadora, o projeto é prova de que a ciência cidadã pode ser instrumento de equidade, reduzindo desigualdades e fortalecendo a capacidade local de resposta em saúde. 

Nas matas e no céu 

À tarde, a programação focou em outras iniciativas de sucesso em ciência cidadã. A pesquisadora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Karine Bueno, apresentou um panorama de ciência participativa desenvolvida em áreas protegidas da Baixada Fluminense, especialmente na Floresta Nacional Mário Xavier, em Seropédica (RJ). 

Ela relatou que foi observado um déficit de educação ambiental no município. A partir dessa constatação, criou em 2018 o programa ‘Guarda Compartilhada Flona Mário Xavier’, voltado à formação de monitores ambientais e à aproximação entre a UFRRJ, as escolas e a unidade de conservação. 

“A área verde na cidade beneficia todo mundo, então todos precisam cuidar e fazer a guarda compartilhada desse ambiente. É preciso haver uma visão de colaboração mútua entre os moradores de Seropédica e esse espaço de uso público.”, disse. 

Segundo Karine, o projeto já envolveu mais de 5 mil estudantes e 100 professores da rede básica, além de centenas de universitários da UFRRJ, que atuam como educadores ambientais. As ações incluem trilhas interpretativas, oficinas, cartilhas, teatro de fantoches e materiais lúdicos produzidos pelos próprios alunos. 

Outros desdobramentos da iniciativa incluem mapeamentos participativos e projetos de fotografia de natureza como ferramenta de divulgação científica. O concurso ‘Baixada Fluminense e Vida que Pulsa’, por exemplo, reuniu mais de 300 imagens enviadas por participantes de diferentes unidades de conservação da região. 

Por fim, o pesquisador do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO), Marcelo Antônio Barros de Cicco, detalhou o projeto ‘EXOSS Citizen Science’, uma rede brasileira de observação e estudo de meteoros baseada em colaboração voluntária entre astrônomos profissionais e amadores. 

Criada em 2015, a iniciativa nasceu com nove entusiastas e doze câmeras e cresceu até se tornar uma rede colaborativa com 81 câmeras em 58 estações distribuídas em todas as regiões do Brasil, reunindo 57 pessoas e 21 instituições. 

“É um projeto genuinamente de ciência cidadã. Ele une o profissional da ciência com o amador que deseja fazer parte de um estudo científico”, definiu. 

A rede monitora bólidos e chuvas de meteoros, determinando órbitas e trajetórias a partir de registros feitos por câmeras instaladas por voluntários, aliando baixo custo à alta motivação dos participantes. 

O pesquisador apresentou imagens de meteoros capturados pelas estações e ressaltou a dimensão educativa da iniciativa, que mantém o site ‘press.exoss.org’ e promove ações de divulgação científica em escolas e museus. 

Entre os resultados do EXOSS, estão colaborações com a NASA, o SETI Institute, o Observatório Nacional e universidades brasileiras. A rede também é responsável por representar no Brasil a ferramenta internacional ‘Relate um Bólido’, que permite ao público enviar relatos e vídeos de meteoros observados no céu. 

“O projeto acaba sendo uma porta de entrada para jovens que minimamente não tinham um interesse forte em ciência e, quando participam, animam-se tanto que acabam seguindo a carreira científica”, finalizou. 

Edição: 
Vinicius Ferreira

Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)