O conteúdo desse portal pode ser acessível em Libras usando o VLibras
Portuguese English Spanish
Interface
Adjust the interface to make it easier to use for different conditions.
This renders the document in high contrast mode.
This renders the document as white on black
This can help those with trouble processing rapid screen movements.
This loads a font easier to read for people with dyslexia.
Busca Avançada
Você está aqui: Notícias » No caminho para o desenvolvimento de novos larvicidas

No caminho para o desenvolvimento de novos larvicidas

Pesquisa mostra que inibição de enzima digestiva das larvas do Aedes bloqueia o desenvolvimento do mosquito. Molécula pode ser a peça-chave para novas estratégias de controle
Por Maíra Menezes17/10/2019 - Atualizado em 17/10/2019

Uma pesquisa realizada pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) desvenda detalhes de um aspecto pouco conhecido da biologia do Aedes, que pode contribuir para novas estratégias de controle do vetor da dengue, Zika e chikungunya. Publicado na revista científica ‘Frontiers in Physiology’, o estudo aponta que a inibição de uma enzima que atua no processo digestivo das larvas do mosquito pode bloquear o desenvolvimento do inseto, impedindo que o Aedes chegue à fase de mosquito adulto, momento em que é capaz de transmitir os vírus.

 
Segundo Raquel Souza, o método de silenciamento genético padronizado na pesquisa pode contribuir para desenvolver um biolarvicida (Foto: Gutemberg Brito)
 

Segundo Fernando Genta, pesquisador do Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos do IOC e coordenador do trabalho, os achados abrem portas para a produção de novos larvicidas. “Os dados indicam que a ação da enzima β-1,3-glucanase no intestino das larvas é crítica para a aquisição de nutrientes. Nossos testes mostraram que a inibição dessa molécula foi capaz tanto de reduzir o avanço do ciclo para o estágio de pupa, no qual ocorre a transformação em mosquito adulto, quanto de provocar a morte das larvas. Considerando que essa enzima não está presente em mamíferos, pode ser um bom alvo para o desenvolvimento de novos larvicidas, com baixo risco para a saúde humana”, afirma o pesquisador.

Além do Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos, a pesquisa contou com a participação dos Laboratórios de Biologia Computacional e Sistemas e de Fisiologia e Controle de Artrópodes Vetores do IOC. O estudo foi financiado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).

Das baratas aos Aedes
À frente de pesquisas que identificaram enzimas β-1,3-glucanases em baratas, gafanhotos e besouros, além de larvas de flebotomíneos (vetores das leishmanioses) e Aedes, o coordenador do estudo explica que essas moléculas podem atuar no aparelho digestivo e no sistema imune dos insetos. Na digestão, as enzimas agem para quebrar um tipo de açúcar – chamado de β-1,3-glucana – que compõe a parede celular dos fungos e das plantas, liberando os nutrientes mais ricos, que se encontram no interior das células. Já na resposta imune, participam do reconhecimento e degradação de microrganismos invasores.

 
"Quando inibimos a enzima digestiva, as larvas se desenvolvem menos, podendo chegar ao colapso metabólico", explica Fernando Genta. (Foto: Foto: Gutemberg Brito)
 

Nos Aedes, cinco variedades da enzima β-1,3-glucanase foram encontradas, sendo três delas com atividade significativa nas larvas. Entre estas, o estudo conseguiu identificar a principal β-1,3-glucanase digestiva e apontou que as outras moléculas devem participar do sistema de defesa dos insetos.

Para chegar aos resultados, os pesquisadores examinaram o DNA do Aedes, identificando os genes que orientam a produção de β-1,3-glucanases. Em seguida, mediram a ativação desses genes no intestino e em outras partes do organismo das larvas. Além disso, foram realizados testes de silenciamento, no qual a ativação dos genes é inibida através de uma metodologia chamada de RNA de interferência (RNAi). “Quando inibimos a enzima digestiva, as larvas se desenvolvem menos, podendo chegar ao colapso metabólico. Já a inibição de enzimas relacionadas ao sistema imune, torna as larvas mais frágeis em situações de estresse, como a restrição de alimento”, pontua Genta.

Alternativas inovadoras
O conhecimento aprofundado sobre a digestão das larvas pode ser o primeiro passo na busca de estratégias de controle do Aedes mais eficazes e seletivas, com menor risco para as pessoas e o meio ambiente. Doutora pelo Programa de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular do IOC e pós-doutoranda do Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos, Raquel Souza aponta que a metodologia de silenciamento genético padronizada na pesquisa pode contribuir para o desenvolvimento de um biolarvicida. “No estudo, as moléculas para o RNAi foram sintetizadas em laboratório. Porém, utilizando técnicas de engenharia genética, é possível programar leveduras [um tipo de fungo que não causa doença] para produzir esses compostos. Ao serem ingeridas pelas larvas, elas liberariam o RNAi, interrompendo a produção da β-1,3-glucanase”, explica a primeira autora do artigo. A especificidade seria a principal vantagem do método, que já é testado em pesquisas para controle do mosquito Anopheles gambiae, vetor da malária, e de pragas agrícolas. “Se a molécula de RNAi tiver como alvo o gene da enzima digestiva do Aedes, não haverá impacto sobre outros insetos, reduzindo o dano ambiental”, completa Raquel.

  
Os fungos são um alimento de alto valor nutricional para as larvas do Aedes, como apontou uma pesquisa anterior dos mesmos cientistas (Foto: Foto: Gutemberg Brito)
 

A produção de inibidores de β-1,3-glucanase a partir de compostos naturais é outra alternativa. Em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pesquisadores do Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos do IOC já isolaram três compostos de algas marinhas capazes de inibir enzimas desse grupo. Considerando os dados da pesquisa recém-publicada, os cientistas avaliam que será possível encontrar inibidores mais potentes ou aprimorar as moléculas já identificadas.

Considerando o papel do Aedes na transmissão de doenças com alto impacto sobre a população, os autores do estudo ressaltam que a possibilidade de desenvolvimento de novos larvicidas pode contribuir para as ações de controle, mas não reduz a necessidade de combater os criadouros do vetor. “É importante lembrar que, assim como a aplicação de inseticidas, o uso de larvicidas deve ser uma medida complementar. O uso excessivo desses produtos leva ao desenvolvimento da resistência pelos mosquitos, reduzindo sua eficácia. Eliminar os criadouros, impedindo o acúmulo de água parada, é fundamental para evitar a reprodução do Aedes e a transmissão de doenças como dengue, Zika e chikungunya”, enfatiza Genta.

Artigo: Souza RS, Gama MdVF, Schama R, Lima JBP, Diaz-Albiter HM and Genta FA (2019) Biochemical and Functional Characterization of Glycoside Hydrolase Family 16 Genes in Aedes aegypti Larvae: Identification of the Major Digestive β-1,3-Glucanase. Front. Physiol. 10:122. doi: 10.3389/fphys.2019.00122

 

Pesquisa mostra que inibição de enzima digestiva das larvas do Aedes bloqueia o desenvolvimento do mosquito. Molécula pode ser a peça-chave para novas estratégias de controle
Por: 
maira

Uma pesquisa realizada pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) desvenda detalhes de um aspecto pouco conhecido da biologia do Aedes, que pode contribuir para novas estratégias de controle do vetor da dengue, Zika e chikungunya. Publicado na revista científica ‘Frontiers in Physiology’, o estudo aponta que a inibição de uma enzima que atua no processo digestivo das larvas do mosquito pode bloquear o desenvolvimento do inseto, impedindo que o Aedes chegue à fase de mosquito adulto, momento em que é capaz de transmitir os vírus.

 
Segundo Raquel Souza, o método de silenciamento genético padronizado na pesquisa pode contribuir para desenvolver um biolarvicida (Foto: Gutemberg Brito)
 

Segundo Fernando Genta, pesquisador do Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos do IOC e coordenador do trabalho, os achados abrem portas para a produção de novos larvicidas. “Os dados indicam que a ação da enzima β-1,3-glucanase no intestino das larvas é crítica para a aquisição de nutrientes. Nossos testes mostraram que a inibição dessa molécula foi capaz tanto de reduzir o avanço do ciclo para o estágio de pupa, no qual ocorre a transformação em mosquito adulto, quanto de provocar a morte das larvas. Considerando que essa enzima não está presente em mamíferos, pode ser um bom alvo para o desenvolvimento de novos larvicidas, com baixo risco para a saúde humana”, afirma o pesquisador.

Além do Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos, a pesquisa contou com a participação dos Laboratórios de Biologia Computacional e Sistemas e de Fisiologia e Controle de Artrópodes Vetores do IOC. O estudo foi financiado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).

Das baratas aos Aedes
À frente de pesquisas que identificaram enzimas β-1,3-glucanases em baratas, gafanhotos e besouros, além de larvas de flebotomíneos (vetores das leishmanioses) e Aedes, o coordenador do estudo explica que essas moléculas podem atuar no aparelho digestivo e no sistema imune dos insetos. Na digestão, as enzimas agem para quebrar um tipo de açúcar – chamado de β-1,3-glucana – que compõe a parede celular dos fungos e das plantas, liberando os nutrientes mais ricos, que se encontram no interior das células. Já na resposta imune, participam do reconhecimento e degradação de microrganismos invasores.

 
"Quando inibimos a enzima digestiva, as larvas se desenvolvem menos, podendo chegar ao colapso metabólico", explica Fernando Genta. (Foto: Foto: Gutemberg Brito)
 

Nos Aedes, cinco variedades da enzima β-1,3-glucanase foram encontradas, sendo três delas com atividade significativa nas larvas. Entre estas, o estudo conseguiu identificar a principal β-1,3-glucanase digestiva e apontou que as outras moléculas devem participar do sistema de defesa dos insetos.

Para chegar aos resultados, os pesquisadores examinaram o DNA do Aedes, identificando os genes que orientam a produção de β-1,3-glucanases. Em seguida, mediram a ativação desses genes no intestino e em outras partes do organismo das larvas. Além disso, foram realizados testes de silenciamento, no qual a ativação dos genes é inibida através de uma metodologia chamada de RNA de interferência (RNAi). “Quando inibimos a enzima digestiva, as larvas se desenvolvem menos, podendo chegar ao colapso metabólico. Já a inibição de enzimas relacionadas ao sistema imune, torna as larvas mais frágeis em situações de estresse, como a restrição de alimento”, pontua Genta.

Alternativas inovadoras
O conhecimento aprofundado sobre a digestão das larvas pode ser o primeiro passo na busca de estratégias de controle do Aedes mais eficazes e seletivas, com menor risco para as pessoas e o meio ambiente. Doutora pelo Programa de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular do IOC e pós-doutoranda do Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos, Raquel Souza aponta que a metodologia de silenciamento genético padronizada na pesquisa pode contribuir para o desenvolvimento de um biolarvicida. “No estudo, as moléculas para o RNAi foram sintetizadas em laboratório. Porém, utilizando técnicas de engenharia genética, é possível programar leveduras [um tipo de fungo que não causa doença] para produzir esses compostos. Ao serem ingeridas pelas larvas, elas liberariam o RNAi, interrompendo a produção da β-1,3-glucanase”, explica a primeira autora do artigo. A especificidade seria a principal vantagem do método, que já é testado em pesquisas para controle do mosquito Anopheles gambiae, vetor da malária, e de pragas agrícolas. “Se a molécula de RNAi tiver como alvo o gene da enzima digestiva do Aedes, não haverá impacto sobre outros insetos, reduzindo o dano ambiental”, completa Raquel.

  
Os fungos são um alimento de alto valor nutricional para as larvas do Aedes, como apontou uma pesquisa anterior dos mesmos cientistas (Foto: Foto: Gutemberg Brito)
 

A produção de inibidores de β-1,3-glucanase a partir de compostos naturais é outra alternativa. Em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pesquisadores do Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos do IOC já isolaram três compostos de algas marinhas capazes de inibir enzimas desse grupo. Considerando os dados da pesquisa recém-publicada, os cientistas avaliam que será possível encontrar inibidores mais potentes ou aprimorar as moléculas já identificadas.

Considerando o papel do Aedes na transmissão de doenças com alto impacto sobre a população, os autores do estudo ressaltam que a possibilidade de desenvolvimento de novos larvicidas pode contribuir para as ações de controle, mas não reduz a necessidade de combater os criadouros do vetor. “É importante lembrar que, assim como a aplicação de inseticidas, o uso de larvicidas deve ser uma medida complementar. O uso excessivo desses produtos leva ao desenvolvimento da resistência pelos mosquitos, reduzindo sua eficácia. Eliminar os criadouros, impedindo o acúmulo de água parada, é fundamental para evitar a reprodução do Aedes e a transmissão de doenças como dengue, Zika e chikungunya”, enfatiza Genta.

Artigo: Souza RS, Gama MdVF, Schama R, Lima JBP, Diaz-Albiter HM and Genta FA (2019) Biochemical and Functional Characterization of Glycoside Hydrolase Family 16 Genes in Aedes aegypti Larvae: Identification of the Major Digestive β-1,3-Glucanase. Front. Physiol. 10:122. doi: 10.3389/fphys.2019.00122

 

Edição: 
Vinicius Ferreira

Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)

Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga. Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga.