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Pesquisa aponta diversidade de vetores da malária no território Yanomami

Amplo levantamento mapeou espécies de mosquitos e criadouros em regiões do Amazonas e Roraima com altos índices da doença
Por Maíra Menezes12/04/2023 - Atualizado em 24/04/2023
 
Armadilha Mosquitent para coleta de mosquitos adultos em meio a habitações yanomamis na região de Parafuri, em Roraima. Foto: Jordi Sánchez Ribas

A malária pode ser transmitida por diferentes espécies de mosquitos silvestres do gênero Anopheles, chamados de anofelinos.  O comportamento dos vetores influencia na dinâmica do agravo, pois, dependendo da espécie, os insetos possuem hábitos diferentes, como os criadouros preferenciais, horários de picada e proximidade com as habitações humanas.

Na Terra Yanomami, uma ampla investigação realizada por pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) revelou a diversidade dos vetores e a taxa de infecção das espécies, contribuindo para compreender o ciclo do agravo e traçar estratégias de controle.

O estudo abrangeu três regiões com altos índices da doença: Marari e Toototobi, no Amazonas, e Parafuri, em Roraima. Entre 2012 e 2015, mais de 6 mil mosquitos adultos e mais de 9 mil larvas de Anopheles foram coletados, além de 177 criadouros mapeados, com registro de características ecológicas e georreferenciamento. 

A partir do estudo, os cientistas propuseram uma nova classificação para os criadouros naturais destas áreas, incluindo descrição detalhada e medida dos criadouros. Também apresentaram melhorias nos métodos de coletas de larvas com uso de botes infláveis visando a otimização do trabalho.

Ao todo, 12 espécies de anofelinos foram encontradas, sendo seis reconhecidas por atuar na transmissão da malária. 

Dados da tese Aspectos ecológicos da transmissão da malária em área indígena Yanomami, Brasil. Arte: Jefferson Mendes

Coordenadora do estudo entomológico, a pesquisadoras Teresa Fernandes Silva do Nascimento, do Laboratório de Mosquitos Transmissores de Hematozoários do IOC, destaca que houve variações significativas entre as regiões e as aldeias.

“O Anopheles darlingi é o principal vetor da malária no Brasil, e confirmamos a importância dele em muitas comunidades. Porém, houve áreas onde esse vetor não foi detectado nesse estudo, sendo outras espécies identificadas. Por exemplo: o Anopheles oswaldoi que, embora não tenha sido encontrado infectado nas áreas yanomamis estudadas, é considerado vetor secundário em algumas áreas do Brasil, e o Anopheles nuneztovari, que é o vetor primário em algumas regiões da Venezuela e Colômbia”, pontua Teresa.

Os resultados da pesquisa foram publicados em três artigos científicos (nas revistas Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, Parasites & Vectors e Genes) e na tese de Jordi Sánchez Ribas, desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Biologia Parasitária do IOC. O trabalho foi orientado por Teresa e Joseli Oliveira Ferreira, pesquisadora do Laboratório de Imunoparasitologia do IOC.

Vetores mais prevalentes

Considerando as três regiões, quatro espécies de vetores foram as mais frequentes. O An. darlingi foi encontrado em todas as aldeias de Marari e Parafuri, sendo o mais comum em diversas delas. Porém, em Toototobi, a presença da espécie foi quase nula no período da pesquisa.

Pesquisadora Teresa Nascimento analisa características morfológicas de insetos capturados para triagem e identificação de vetores. Foto: Ozimar José de Souza

Mosquitos do complexo de espécies An. oswaldoi s.l. foram predominantes em aldeias de Toototobi e Parafuri. O complexo é composto por espécies crípticas: grupos de insetos com aparência muito semelhante, mas com diferenças genéticas e de comportamento, que influenciam na capacidade vetorial.

Ao analisar o genoma dos mosquitos, os pesquisadores identificaram um dos membros do complexo de espécies mais importantes na transmissão da malária: Anopheles oswaldoi A. Considerado na literatura como um vetor secundário da malária, o inseto pode ter papel importante na transmissão, como já foi observado em algumas áreas no Acre, em Rondônia e na Colômbia.

Principal transmissor da malária em regiões da Venezuela, da Colômbia e do Peru, o An. nuneztovari foi capturado em grande quantidade em uma única aldeia de Marari. Nas outras comunidades, esteve ausente ou foi raramente encontrado.

Por fim, o Anopheles intermedius predominou em uma aldeia de Toototobi e foi capturado com menor frequência em outras aldeias das três regiões. O mosquito é considerado um vetor secundário da malária, transmitindo a doença ocasionalmente.

Criadouros e horários de picadas

A maior parte dos mosquitos foi capturada fora das habitações indígenas, chamadas de shabono. Para algumas espécies como An. oswaldoi s.l. e An. nuneztovari s.l., o maior volume de picadas ocorreu no período do crepúsculo, quando os indígenas ainda praticam atividades externas, como tomar banho, pescar e coletar água.

Porém, isso não ocorreu para o An. darlingi, cujo maior pico de atividade foi verificado ao redor da meia noite. 

Anopheles darlingi: vetor foi capturado nas proximidades e dentro das habitações indígenas. Mosquitos foram encontrados infectados pelo parasito da malária durante a pesquisa. Foto: Josué Damacena

Segundo Teresa, nos locais com presença do An. darlingi, a transmissão da malária pode ocorrer também dentro dos shabonos, durante a noite.

An. darlingi foi a espécie mais encontrada dentro dos shabonos, embora tenha predominado no peridomicílio, nas áreas de Parafuri e Marari. Observamos dois picos de atividade desse vetor: no crepúsculo vespertino e perto de meia-noite. Nesse horário, os indígenas já estão dormindo e podem ser picados”, aponta a entomologista.

Reforçando o papel do vetor na transmissão da malária, oito espécimes de An. darlingi foram identificados com infecção por Plasmodium, parasito causador da doença. Os cientistas também detectaram o parasito em quatro An. intermedius e em um An. nuneztovari.

A proliferação do An. darlingi foi verificada principalmente em lagos associadas a rios, com grande exposição ao sol. Outros vetores apresentaram maior diversidade de criadouros, incluindo lagos, áreas inundadas, córregos e igarapés. 

Pesquisadores investigaram a presença de larvas de vetores da malária em criadouros temporários e permanentes a uma distância de até 1 km das habitações yanomamis. Foto: Jordi Sánchez Ribas

De acordo com Teresa, o controle da malária é feito principalmente através do diagnóstico e tratamento dos indivíduos infectados. Medidas que buscam reduzir o contato com vetores também podem contribuir para conter a doença.

“Mosquiteiros impregnados com inseticida podem ser usados para reduzir as picadas à noite, mas é importante ter monitoramento constante para verificar se a tela não está rasgada e se é fechada corretamente, ou seja, se o uso dessa ferramenta está sendo adequado. Além disso, os criadouros próximos às aldeias podem ser monitorados para avaliar a presença de larvas e do principal vetor. Embora o manejo das grandes coleções liquidas, como os rios, não seja viável, pequenos criadouros podem ser eliminados”, enumera a pesquisadora.

O estudo entomológico integrou um grande projeto de pesquisa, que investigou também a ocorrência da malária e coinfecções com parasitoses intestinais e hepatites virais entre os yanomamis. Coordenado por Joseli, o projeto teve uma publicação recente, que apontou alto índice de parasitoses intestinais em cinco aldeias.

A pesquisa contou com apoio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (DSEI Yanomami).  Além do IOC, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj) financiaram o estudo.

Amplo levantamento mapeou espécies de mosquitos e criadouros em regiões do Amazonas e Roraima com altos índices da doença
Por: 
maira
 
Armadilha Mosquitent para coleta de mosquitos adultos em meio a habitações yanomamis na região de Parafuri, em Roraima. Foto: Jordi Sánchez Ribas

A malária pode ser transmitida por diferentes espécies de mosquitos silvestres do gênero Anopheles, chamados de anofelinos.  O comportamento dos vetores influencia na dinâmica do agravo, pois, dependendo da espécie, os insetos possuem hábitos diferentes, como os criadouros preferenciais, horários de picada e proximidade com as habitações humanas.

Na Terra Yanomami, uma ampla investigação realizada por pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) revelou a diversidade dos vetores e a taxa de infecção das espécies, contribuindo para compreender o ciclo do agravo e traçar estratégias de controle.

O estudo abrangeu três regiões com altos índices da doença: Marari e Toototobi, no Amazonas, e Parafuri, em Roraima. Entre 2012 e 2015, mais de 6 mil mosquitos adultos e mais de 9 mil larvas de Anopheles foram coletados, além de 177 criadouros mapeados, com registro de características ecológicas e georreferenciamento. 

A partir do estudo, os cientistas propuseram uma nova classificação para os criadouros naturais destas áreas, incluindo descrição detalhada e medida dos criadouros. Também apresentaram melhorias nos métodos de coletas de larvas com uso de botes infláveis visando a otimização do trabalho.

Ao todo, 12 espécies de anofelinos foram encontradas, sendo seis reconhecidas por atuar na transmissão da malária. 

Dados da tese Aspectos ecológicos da transmissão da malária em área indígena Yanomami, Brasil. Arte: Jefferson Mendes

Coordenadora do estudo entomológico, a pesquisadoras Teresa Fernandes Silva do Nascimento, do Laboratório de Mosquitos Transmissores de Hematozoários do IOC, destaca que houve variações significativas entre as regiões e as aldeias.

“O Anopheles darlingi é o principal vetor da malária no Brasil, e confirmamos a importância dele em muitas comunidades. Porém, houve áreas onde esse vetor não foi detectado nesse estudo, sendo outras espécies identificadas. Por exemplo: o Anopheles oswaldoi que, embora não tenha sido encontrado infectado nas áreas yanomamis estudadas, é considerado vetor secundário em algumas áreas do Brasil, e o Anopheles nuneztovari, que é o vetor primário em algumas regiões da Venezuela e Colômbia”, pontua Teresa.

Os resultados da pesquisa foram publicados em três artigos científicos (nas revistas Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, Parasites & Vectors e Genes) e na tese de Jordi Sánchez Ribas, desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Biologia Parasitária do IOC. O trabalho foi orientado por Teresa e Joseli Oliveira Ferreira, pesquisadora do Laboratório de Imunoparasitologia do IOC.

Vetores mais prevalentes

Considerando as três regiões, quatro espécies de vetores foram as mais frequentes. O An. darlingi foi encontrado em todas as aldeias de Marari e Parafuri, sendo o mais comum em diversas delas. Porém, em Toototobi, a presença da espécie foi quase nula no período da pesquisa.

Pesquisadora Teresa Nascimento analisa características morfológicas de insetos capturados para triagem e identificação de vetores. Foto: Ozimar José de Souza

Mosquitos do complexo de espécies An. oswaldoi s.l. foram predominantes em aldeias de Toototobi e Parafuri. O complexo é composto por espécies crípticas: grupos de insetos com aparência muito semelhante, mas com diferenças genéticas e de comportamento, que influenciam na capacidade vetorial.

Ao analisar o genoma dos mosquitos, os pesquisadores identificaram um dos membros do complexo de espécies mais importantes na transmissão da malária: Anopheles oswaldoi A. Considerado na literatura como um vetor secundário da malária, o inseto pode ter papel importante na transmissão, como já foi observado em algumas áreas no Acre, em Rondônia e na Colômbia.

Principal transmissor da malária em regiões da Venezuela, da Colômbia e do Peru, o An. nuneztovari foi capturado em grande quantidade em uma única aldeia de Marari. Nas outras comunidades, esteve ausente ou foi raramente encontrado.

Por fim, o Anopheles intermedius predominou em uma aldeia de Toototobi e foi capturado com menor frequência em outras aldeias das três regiões. O mosquito é considerado um vetor secundário da malária, transmitindo a doença ocasionalmente.

Criadouros e horários de picadas

A maior parte dos mosquitos foi capturada fora das habitações indígenas, chamadas de shabono. Para algumas espécies como An. oswaldoi s.l. e An. nuneztovari s.l., o maior volume de picadas ocorreu no período do crepúsculo, quando os indígenas ainda praticam atividades externas, como tomar banho, pescar e coletar água.

Porém, isso não ocorreu para o An. darlingi, cujo maior pico de atividade foi verificado ao redor da meia noite. 

Anopheles darlingi: vetor foi capturado nas proximidades e dentro das habitações indígenas. Mosquitos foram encontrados infectados pelo parasito da malária durante a pesquisa. Foto: Josué Damacena

Segundo Teresa, nos locais com presença do An. darlingi, a transmissão da malária pode ocorrer também dentro dos shabonos, durante a noite.

An. darlingi foi a espécie mais encontrada dentro dos shabonos, embora tenha predominado no peridomicílio, nas áreas de Parafuri e Marari. Observamos dois picos de atividade desse vetor: no crepúsculo vespertino e perto de meia-noite. Nesse horário, os indígenas já estão dormindo e podem ser picados”, aponta a entomologista.

Reforçando o papel do vetor na transmissão da malária, oito espécimes de An. darlingi foram identificados com infecção por Plasmodium, parasito causador da doença. Os cientistas também detectaram o parasito em quatro An. intermedius e em um An. nuneztovari.

A proliferação do An. darlingi foi verificada principalmente em lagos associadas a rios, com grande exposição ao sol. Outros vetores apresentaram maior diversidade de criadouros, incluindo lagos, áreas inundadas, córregos e igarapés. 

Pesquisadores investigaram a presença de larvas de vetores da malária em criadouros temporários e permanentes a uma distância de até 1 km das habitações yanomamis. Foto: Jordi Sánchez Ribas

De acordo com Teresa, o controle da malária é feito principalmente através do diagnóstico e tratamento dos indivíduos infectados. Medidas que buscam reduzir o contato com vetores também podem contribuir para conter a doença.

“Mosquiteiros impregnados com inseticida podem ser usados para reduzir as picadas à noite, mas é importante ter monitoramento constante para verificar se a tela não está rasgada e se é fechada corretamente, ou seja, se o uso dessa ferramenta está sendo adequado. Além disso, os criadouros próximos às aldeias podem ser monitorados para avaliar a presença de larvas e do principal vetor. Embora o manejo das grandes coleções liquidas, como os rios, não seja viável, pequenos criadouros podem ser eliminados”, enumera a pesquisadora.

O estudo entomológico integrou um grande projeto de pesquisa, que investigou também a ocorrência da malária e coinfecções com parasitoses intestinais e hepatites virais entre os yanomamis. Coordenado por Joseli, o projeto teve uma publicação recente, que apontou alto índice de parasitoses intestinais em cinco aldeias.

A pesquisa contou com apoio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (DSEI Yanomami).  Além do IOC, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj) financiaram o estudo.

Edição: 
Vinicius Ferreira

Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)