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Entre 10 milhões de brasileiros

Primeiro censo nacional revelava dados do país imperial no qual nasceu Oswaldo Cruz, há 150 anos
Por Maíra Menezes04/08/2022 - Atualizado em 10/08/2022
Casa em que nasceu Oswaldo Cruz, na Chácara do Dizimeiro, São Luiz do Paraitinga, São Paulo, onde viveu os primeiros cinco anos de vida. Acervo COC/Fiocruz

Oswaldo Gonçalves Cruz nasceu na cidade de São Luiz do Paraitinga, no Vale do Paraíba paulista, filho mais velho do médico Bento Gonçalves Cruz e de Amália Taborda Bulhões Cruz. Naquele tempo, Dom Pedro II governava o Império do Brasil e a cultura do café vivia os últimos anos de seu período áureo na região. 

Dois anos antes, o país tinha encerrado o maior conflito bélico de sua história: a Guerra do Paraguai – confronto que mobilizou a nação e motivou Bento a interromper os estudos para atuar como 2º cirurgião médico voluntário. 

Apesar da vitória da tríplice aliança, formada por Brasil, Uruguai e Argentina, a guerra deixou um rastro de destruição no país: mais de 50 mil brasileiros morreram e a nação ficou endividada. Foi nesse contexto que se realizou o primeiro censo do país.

“O Brasil precisava se reerguer e havia a percepção de que não poderia fazer isso sem conhecimento de si mesmo. O Imperador defendeu a realização do censo e houve apoio de todo o parlamento”, conta o historiador do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Nelson Senra, lembrando que, desde a independência, em 1822, havia propostas para o censo no país, mas nenhuma conseguira sair do papel.

O Censo Geral do Império de 1872 com informações sobre o estado da população do Brasil à época do 2º Reinado. Acervo IBGE.

Após dois anos de preparação, o levantamento foi iniciado em 1º de agosto de 1872. A apuração dos dados, encerrada em 1874, revelou um país com 10 milhões de habitantes. 

O Censo Geral do Império foi o único a registrar a população escravizada no Brasil. Apesar da proibição do tráfico desde 1850 e da Lei do Ventre Livre, de 1871, o número de pessoas escravizadas em 1872 chegava a 1,5 milhão, ou seja, cerca de 15% da população. 

“Os historiadores lamentam que não se investigaram as religiões dos escravos. Por definição, foram considerados católicos, já que eram batizados ao chegar no Brasil. Mas eles guardavam suas religiões africanas e isso deveria ter sido perguntado”, comenta Senra.

Apesar das lacunas, que refletem tanto os preconceitos da época quanto as dificuldades de realizar um levantamento censitário num país continental, o censo de 1872 é reconhecido pela alta qualidade. As informações foram coletadas nas 20 províncias e na capital do Império. Os dados foram computados em 8.546 tabelas.

“Mesmo recém-nascido, Oswaldo Cruz certamente foi recenseado. O censo mobilizou o país e os homens das ‘boas famílias’ da época participaram das comissões censitárias paroquiais. Infelizmente, as fichas onde os chefes das famílias preenchiam as informações não foram guardadas, mas não há dúvida de que Oswaldo Cruz está incluído no censo de 1872”, diz Senra.

Oswaldo Cruz com apenas 1 ano de idade (Imagem gentilmente cedida por Ugo Oswaldo Cruz).

O retrato inédito da população brasileira mostra um país majoritariamente negro, com 58% de pretos e pardos, ante 38% de brancos e 4% de indígenas. O país era majoritariamente masculino e jovem: 51,6% de homens e 48,4% de mulheres; cerca de 20% de crianças até 10 anos e somente 8% de idosos com mais de 70.

A profissão mais comum era a de lavrador, com mais de três milhões de pessoas. Em segundo lugar, apareciam os serviços domésticos, ocupando mais de um milhão. Entre as profissões liberais, os artistas estavam em maior número: cerca de 41 mil. Já os médicos somavam 1.729. Mais de 80% dos habitantes eram analfabetos.

Oswaldo nasceu, portanto, no contexto de um Brasil rural e escravocrata, com população majoritariamente analfabeta. Reconhecido pelo enfrentamento da febre amarela, da peste bubônica e da varíola, direcionou-se para o interior do país. Liderou pessoalmente expedições contra a malária em Rondônia e contra a febre amarela no Pará. 

Como diretor do então Instituto Oswaldo Cruz, organizou missões científicas no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, revelando as condições de saúde do Brasil profundo. De muitas formas, o cientista visionário implementou iniciativas que lançaram luz, com ciência e saúde, sobre questões ligadas às profundas desigualdades do país – um legado que vive no IOC.

Família de Paudalho em 1912, época em que as expedições científicas originais do Instituto Oswaldo Cruz percorreram o interior do país. (Acervo COC/Fiocruz).

Na luta contra as doenças rurais e urbanas, Oswaldo aplicou conhecimentos de ponta, baseados numa ciência nova que transformou a medicina no final do século XIX: a microbiologia. Confira na próxima reportagem.

Primeiro censo nacional revelava dados do país imperial no qual nasceu Oswaldo Cruz, há 150 anos
Por: 
maira
Casa em que nasceu Oswaldo Cruz, na Chácara do Dizimeiro, São Luiz do Paraitinga, São Paulo, onde viveu os primeiros cinco anos de vida. Acervo COC/Fiocruz

Oswaldo Gonçalves Cruz nasceu na cidade de São Luiz do Paraitinga, no Vale do Paraíba paulista, filho mais velho do médico Bento Gonçalves Cruz e de Amália Taborda Bulhões Cruz. Naquele tempo, Dom Pedro II governava o Império do Brasil e a cultura do café vivia os últimos anos de seu período áureo na região. 

Dois anos antes, o país tinha encerrado o maior conflito bélico de sua história: a Guerra do Paraguai – confronto que mobilizou a nação e motivou Bento a interromper os estudos para atuar como 2º cirurgião médico voluntário. 

Apesar da vitória da tríplice aliança, formada por Brasil, Uruguai e Argentina, a guerra deixou um rastro de destruição no país: mais de 50 mil brasileiros morreram e a nação ficou endividada. Foi nesse contexto que se realizou o primeiro censo do país.

“O Brasil precisava se reerguer e havia a percepção de que não poderia fazer isso sem conhecimento de si mesmo. O Imperador defendeu a realização do censo e houve apoio de todo o parlamento”, conta o historiador do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Nelson Senra, lembrando que, desde a independência, em 1822, havia propostas para o censo no país, mas nenhuma conseguira sair do papel.

O Censo Geral do Império de 1872 com informações sobre o estado da população do Brasil à época do 2º Reinado. Acervo IBGE.

Após dois anos de preparação, o levantamento foi iniciado em 1º de agosto de 1872. A apuração dos dados, encerrada em 1874, revelou um país com 10 milhões de habitantes. 

O Censo Geral do Império foi o único a registrar a população escravizada no Brasil. Apesar da proibição do tráfico desde 1850 e da Lei do Ventre Livre, de 1871, o número de pessoas escravizadas em 1872 chegava a 1,5 milhão, ou seja, cerca de 15% da população. 

“Os historiadores lamentam que não se investigaram as religiões dos escravos. Por definição, foram considerados católicos, já que eram batizados ao chegar no Brasil. Mas eles guardavam suas religiões africanas e isso deveria ter sido perguntado”, comenta Senra.

Apesar das lacunas, que refletem tanto os preconceitos da época quanto as dificuldades de realizar um levantamento censitário num país continental, o censo de 1872 é reconhecido pela alta qualidade. As informações foram coletadas nas 20 províncias e na capital do Império. Os dados foram computados em 8.546 tabelas.

“Mesmo recém-nascido, Oswaldo Cruz certamente foi recenseado. O censo mobilizou o país e os homens das ‘boas famílias’ da época participaram das comissões censitárias paroquiais. Infelizmente, as fichas onde os chefes das famílias preenchiam as informações não foram guardadas, mas não há dúvida de que Oswaldo Cruz está incluído no censo de 1872”, diz Senra.

Oswaldo Cruz com apenas 1 ano de idade (Imagem gentilmente cedida por Ugo Oswaldo Cruz).

O retrato inédito da população brasileira mostra um país majoritariamente negro, com 58% de pretos e pardos, ante 38% de brancos e 4% de indígenas. O país era majoritariamente masculino e jovem: 51,6% de homens e 48,4% de mulheres; cerca de 20% de crianças até 10 anos e somente 8% de idosos com mais de 70.

A profissão mais comum era a de lavrador, com mais de três milhões de pessoas. Em segundo lugar, apareciam os serviços domésticos, ocupando mais de um milhão. Entre as profissões liberais, os artistas estavam em maior número: cerca de 41 mil. Já os médicos somavam 1.729. Mais de 80% dos habitantes eram analfabetos.

Oswaldo nasceu, portanto, no contexto de um Brasil rural e escravocrata, com população majoritariamente analfabeta. Reconhecido pelo enfrentamento da febre amarela, da peste bubônica e da varíola, direcionou-se para o interior do país. Liderou pessoalmente expedições contra a malária em Rondônia e contra a febre amarela no Pará. 

Como diretor do então Instituto Oswaldo Cruz, organizou missões científicas no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, revelando as condições de saúde do Brasil profundo. De muitas formas, o cientista visionário implementou iniciativas que lançaram luz, com ciência e saúde, sobre questões ligadas às profundas desigualdades do país – um legado que vive no IOC.

Família de Paudalho em 1912, época em que as expedições científicas originais do Instituto Oswaldo Cruz percorreram o interior do país. (Acervo COC/Fiocruz).

Na luta contra as doenças rurais e urbanas, Oswaldo aplicou conhecimentos de ponta, baseados numa ciência nova que transformou a medicina no final do século XIX: a microbiologia. Confira na próxima reportagem.

Edição: 
Raquel Aguiar
Vinicius Ferreira

Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)